O Livro Mude ou morra, publicado em 2017, destaca a mudança dos mecanismos de competição em tempos de Uber, iFood e Airbnb, com ênfase para o modelo “campeão x desafiante”.
Empresas vencedoras da nova economia, independentemente de seu tamanho e setor de atuação, têm uma característica comum quando o assunto é a operação: elas são capazes de fazer repetidas entregas de qualidade com muita velocidade. Isso não é fácil, no entanto. Fácil é fazer uma entrega rápida com alguma velocidade. Fácil é fazer muitas entregas boas sem rapidez. Manter-se entregando com velocidade e qualidade por muito tempo e com consistência é difícil.
Quando nos referimos a alto rendimento, estamos falando dessa capacidade de fazer repetidas entregas de qualidade com muita velocidade. Isso pode ser um grande diferencial competitivo na nova economia. Existem algumas técnicas para trabalhar dessa forma e queremos tratar das cinco principais aqui:
1. ANDAR EM BLOCO
O primeiro ingrediente dessa receita de sucesso é fazer toda a equipe andar em bloco, focada e com disciplina rumo a um objetivo comum. Nada dispersa mais energia do que pessoas trabalhando de forma isolada, perseguindo coisas diferentes. E, acredite, é o que mais acontece. Quantas vezes você já ouviu que as diferentes áreas da empresa “não conversam”? Ou que “existem feudos” em determinada companhia?
Não existe sucesso enquanto todos os membros de uma equipe não remarem para o mesmo lado. Muitas vezes é o CEO que faz o papel de maestro, garantindo que toda a orquestra toque em harmonia, rendendo o máximo potencial. Mas como o CEO pode pedir que as pessoas andem em bloco, rumo a um objetivo comum, se elas não sabem qual é esse objetivo? Se não entendem como o objetivo maior da companhia se desdobra nas pequenas ações de seu dia a dia?
Um elemento aglutinador que funciona muito bem é o modelo de OKRs (sigla em inglês de objetivos e resultados-chave), uma metodologia desenvolvida pelo Google que rapidamente se popularizou entre startups do mundo todo. Na nossa opinião, isso aconteceu pela simplicidade do modelo e pelo fato de poder ser adotado por empresas de todos os setores e tamanhos. A grande virtude desse modelo é que ele garante o alinhamento de todos os envolvidos no projeto. O lado bacana é que os objetivos e resultados são representados em forma de tarefas determinadas pela própria equipe. Isso ajuda muito sua compreensão e aproximação com o dia a dia.
Um bom OKR tem duas partes: um objetivo e seus resultados-chave. O objetivo é aquilo que você quer que aconteça, os resultados-chave são indicadores para medir se você chegou lá. Por exemplo, ainda no caso da padaria, o OKR pode ser:
• Objetivo-chave: ser o maior player do bairro na venda de
pães até o mês de outubro.
• Resultado-chave: vender 100 pães por dia.
Um bom OKR tem um objetivo e seus resultados. É curto, simples e pensado para um trimestre adiante
O prazo curto garante que a empresa ou o projeto sigam ágeis e consigam alterar sua rota caso mude o cenário. Mais do que isso, em períodos superiores a três meses as chances de você falhar no desenho da meta aumentam substancialmente. Meta boa é aquela que você atinge ou não atinge por pouco. Meta tem que ser justa. E, de novo, o ciclo curto vai garantir que você consiga mudar o plano caso o cenário mude. Às vezes, o jogo muda e ninguém muda o que está fazendo simplesmente porque está seguindo o plano.
Os OKRs devem ser desenhados de cima para abaixo. Normalmente, começa-se com os OKRs da empresa como um todo ou do CEO e, a partir daí, os demais vão sendo desenhados em cascata. O dos diretores, dos gerentes, dos analistas e assim por diante. Não importa quantos níveis hierárquicos sua empresa tem. O importante é que todos os níveis estejam alinhados e bem amarrados. Para que uma pessoa bata sua meta, é preciso que aquela do nível abaixo também o faça. Se todos o fizerem, a empresa bate a meta! Entendeu como se cria essa dinâmica de interdependência?
É importante mensurar o OKR ao longo do percurso. Se tenho uma padaria e o resultado-chave perseguido for vender 100 pães por dia até o fim do ano, minha métrica é a quantidade de pães vendidos por dia. Chama-se a isso, como muitos já sabem, de KPI (sigla em inglês de indicador-chave de desempenho).
Em um negócio, os indicadores podem ser a quantidade vendida em certo período de tempo, o número de clientes ou usuários, o engajamento, o faturamento, a aprovação dos consumidores, o retorno do investimento.
Uma dica bacana é sempre trabalhar com KPIs casados, olhando para uma métrica quantitativa e outra qualitativa – por exemplo, faturamento x margem. Por que isso é tão importante? Porque a segunda meta sempre vai “corrigir” a primeira. Se você diz a um padeiro que ele tem como meta vender os tais 100 pães por dia, ele pode baixar o preço absurdamente, voltar no dia seguinte e dizer “Feito!”. Aí você descobre que ele vendeu cada pão a 1 centavo. Tecnicamente, ele está correto.
O casamento de KPIs clássicas com OKRs costuma ser uma boa forma de pensar um negócio. Principalmente para quem está no começo. Os OKRs vão garantir que todos os envolvidos entendam quais são os projetos-chave. E os KPIs, por sua vez, servirão como termômetro de desempenho.
2. TER GESTÃO HORIZONTAL
Já dizia a (antiga) sabedoria corporativa: manda quem pode, obedece quem tem juízo. Essa é uma das frases da velha economia que odiamos exatamente por representar fielmente o que ela tem de pior. O modelo de chefe que detém o poder como um antigo faraó e toma as decisões do dia a dia a seu bel-prazer sem se incomodar como isso impactará a vida de seus clientes ou colegas de trabalho ainda é visto nos quatro cantos do país todos os dias. Em um ambiente no qual o objetivo maior passa a ser o poder, é natural que as pessoas não se importem com o cliente. Tratá-lo bem não as fará serem promovidas; bajular o chefe, sim!
É por isso que a lógica de gestão horizontal representa uma ruptura radical nos antigos organogramas que mais pareciam pirâmides egípcias do que qualquer outra coisa. A forma mais eficaz de romper esse modus operandi é trabalhar para tornar as tomadas de decisão mais racionais, porque, em ambientes de muita subjetividade, existe uma grande margem para que o poder do cargo entre em cena e faça um estrago.
Um elemento que favorece a tomada de decisão mais racional e normalmente benéfica ao cliente é a ausência de ego. De quem veio essa sugestão? Não interessa. Interessa o fato de ela ter sido embasada em dados. Aceitar que o estagiário pode ter uma ideia melhor do que o diretor é o que chamamos de “zero ego”.
Simplificando muito, esse conceito sugere que uma boa ideia pode vir de qualquer pessoa da equipe. É a antítese da hierarquia da velha economia. E ela pode ser turbinada por uma gestão orientada para os dados! Os dados são o tesouro do universo digital. Eles são produzidos com uma abundância absurda, o big data! Quem os gera? Você.
Como cliente, você oferece esses dados o tempo todo a empresas sem se dar conta. Sabe aquela alegria pelo Gmail ser gratuito ou por não precisar pagar nada pelo Facebook, com seus recursos tão legais? Então, você está pagando com suas informações. Essas empresas usam seus dados para vender publicidade a outras empresas. Ou seja, não existe almoço grátis na internet. Se você não sabe como está pagando por algo, tenha certeza de que é com seus dados. O raciocínio básico para o uso de dados tem três fases:
EXTRAÇÃO > ANÁLISE > AÇÃO
Na primeira fase, como o nome sugere, você vai garimpar os dados dos clientes que considera relevantes. Vamos dizer que você tem um restaurante e consegue descobrir com que frequência as pessoas vão até ele em cada dia da semana. Depois, ao analisá-los, entende que às segundas, terças e quartas-feiras há, em média, 50% menos visitas do que nos demais dias. De novo, ter essa informação e não transformá-la em ação de nada serve.
Criar uma campanha de desconto nesses dias como conclusão desse estudo e medir o resultado fi nanceiro seria o passo fi nal para concluir uma jornada de tomada de decisão baseada em dados. Não é tão difícil, vai…
Demos um exemplo muito simples para mostrar o raciocínio, mas a internet permite passos bem mais ousados. Algumas empresas já estão criando modelos de vendas preditivas.
Isso mesmo: elas querem adivinhar o que você vai comprar antes que você mesmo saiba. Para isso, estão criando modelos estatísticos capazes de chegar a essa conclusão a partir da análise de milhares de informações de outros clientes. Entendeu até onde o uso de dados pode chegar? Por fim, um exemplo de uso de dados que já é realidade: os grandes e-commerces de todo o País usam uma tecnologia capaz de montar uma homepage (página inicial) para cada
cliente com base em seus gostos, suas compras na loja e sua navegação na internet. Se você abrir o site dessa loja agora e seu marido ou sua esposa também, é possível que vejam produtos diferentes, porque cada loja foi “montada” em uma fração de segundos a partir dos dados que você ofereceu a essas empresas. Há sete formas simples de extrair dados de seus clientes, conforme o quadro ao lado.
O desafio não é ter dados, e sim, ante a quantidade gigantesca de dados disponíveis, definir quais são relevantes. De novo, retorne aos OKRs e KPIs. Outro aspecto relevante do zero ego é o conceito do uso de comunidade ou equipe.
Quando fizemos um site novo para nossa empresa, Organica, por exemplo, desenhamos, planejamos, ajustamos e colocamos no ar. Subimos um post em redes sociais pedindo comentários dos internautas. Em menos de 24 horas, foram sugeridos vários ajustes no site. É por isso que as startups amam realizar workshops. Workshops são como grandes reuniões em que, guiados por um facilitador, os membros de uma equipe buscam soluções de forma colaborativa. Gestão horizontal.
3. TER A CULTURA DO UAU!
Oferecer uma boa experiência aos clientes deveria ser a regra em qualquer negócio. Oferecer uma experiência memorável deveria ser o desafio. Afinal, só existe uma coisa melhor do que um cliente satisfeito: um cliente surpreendido positivamente. A geração de uma surpresa em um cliente é que os americanos chamam de WOW Experience, ou Experiência UAU! “Uau!” da expressão mesmo, aquele ar de surpresa positiva e totalmente inesperada.
Entregar a um cliente mais do que ele espera é o que chamamos de cultura do UAU. Na Netshoes, houve uma época em que, devido a melhorias do departamento de logística, conseguimos entregar um pedido na cidade de São Paulo em apenas dois dias. E em determinado momento pensamos em reduzir esse prazo para um dia. Então surgiu a dúvida: comunicamos ao cliente ou não essa redução? Possivelmente, venderíamos mais se anunciássemos essa mudança logo de cara.
Mas não recorremos a essa opção. Em vez disso, preferimos surpreender o cliente com o produto chegando na casa dele no dia seguinte à compra.
Entregar um serviço melhor ou mais rápido do que o solicitado é o que chamamos de cultura do UAU. Isso nos ajudou a criar uma marca sólida pautada nessa cultura. Os clientes escreviam diariamente contando que estavam surpresos com a rapidez – isso ajuda a fortalecer a marca. Gente que está surpresa com um produto ou serviço, e que divulga isso entre seu networking, gera solidez para a marca.
Por que encantar clientes?
Simples. Clientes surpreendidos positivamente são mais propensos a se tornarem fiéis e, melhor ainda, a falar bem da sua marca. Uma das coisas que mais ajudará você a crescer exponencialmente é ter clientes que, de forma espontânea, façam o boca a boca de seu produto e serviço.
Uma coisa que startups e companhias líderes da nova economia têm em comum, independentemente do setor de atuação ou do modelo de negócio, é o fato de trabalharem arduamente para entregar a experiência UAU a seus consumidores.
A cultura do UAU tem muito de planejamento e pouco de improviso. É preciso que se criem processos para que as pessoas enxerguem oportunidades e tenham autonomia para agir com velocidade em meio ao caos do dia a dia. Os termos-chave para que a cultura do UAU se transforme em ações são quatro:
- Garantir que todas as pessoas estejam não somente alinhadas com a estratégia, mas também impregnadas com a cultura do UAU, aquele entendimento de que sempre devemos nos esforçar para encantar nossos clientes.
- Criar processos para que essa estrutura funcione. No caso do SAC, por exemplo, é preciso desenhar um processo e um critério para que as pessoas identifiquem oportunidades como aquela para poder agir.
- Nada acontece se quem estiver na ponta, de cara com o cliente, não tiver uma autonomia mínima para tomar decisões. É o que chamamos de autonomia com responsabilidade. Isso garante envolvimento da equipe e agilidade no processo.
- Por fim, para que tudo isso funcione é preciso que haja um alinhamento prévio de determinação de orçamento para esse tipo de ação, para que não haja surpresas.
Um aspecto da cultura do UAU cada vez mais explorado por empresas vencedoras da nova economia é entender que, naquele momento de surpresa, o consumidor está no clímax da relação com sua marca. O que você pode fazer nesta hora? Pedir uma recomendação! Mapeie as oportunidades UAU em sua relação com o cliente e, no momento máximo de entrega
de valor, de conexão emocional, aproveite para pedir uma recomendação positiva, um depoimento, uma história real. Ele estará muito mais propenso a elogiar sua empresa.
Como saber quando seu cliente vai ajudá-lo a vender ou quando a coisa não está indo tão bem? O modelo NPS da Bain & Company é uma ferramenta muito útil para isso.
4. TER PESSOAS + CAPITAL
Há dois recursos importantes em um empreendimento, em especial na nova economia – pessoas e capital. Primeiro, vamos falar de pessoas. Sozinho você até consegue começar um negócio, mas não irá muito longe na nova economia.
Para quem está começando um negócio do zero, muitas vezes o primeiro passo é a escolha de um sócio. Um erro bastante comum que observamos nesse momento é escolher amigos para serem sócios. É algo tentador, afinal são pessoas queridas e que já conhecem você bem. Bons sócios são pessoas com alinhamento de propósito, habilidades complementares e, acima de tudo, parceria.
Encontrar pessoas para seguir nessa jornada com você não é tarefa fácil. O que você precisa ter em mente nessa hora é o seu MVP, ou produto mínimo viável, em termos de recursos humanos. Não vai dar para escolher todas as pessoas que você gostaria de ter por perto. Como não se pode ter tudo, veja quais são as competências de que seu negócio precisa e que você não tem.
Esse é um momento em que o autoconhecimento pesa. Você já olhou para dentro de si mesmo? Porque se não estiver ciente de suas fraquezas e de suas forças, como vai saber o que falta? Então, já se analisou? Essa não é a hora de querer ser o Super-Homem, nem um sabichão. É hora de reconhecer o que você não tem e buscar isso em outras pessoas.
Uma solução que muitas startups estão encontrando é buscar conselheiros para o negócio em troca de uma pequena participação na sociedade.
Mas você vai precisar de pessoas com dedicação maior também. Não se arrisque escolhendo só pessoas que são uma aposta e que ainda não mostraram resultados. Escolha gente que você já conhece, gente com quem já trabalhou, gente que já mostrou que sabe e que entrega o que você precisa. Procure essas pessoas no mercado e tente convencê-las de seus propósitos. Essas pessoas têm que estar encantadas pela sua ideia tanto quanto você. Existe uma equação clássica da psicologia citada no livro Capitalismo consciente, de John Mackey:
DESESPERO = SOFRIMENTO – SIGNIFICADO
Vendo a equação, fica claro que o caminho para não perder o prumo é o propósito, o significado. Duas palavras-chave que estão intimamente ligadas com o que você coloca como base de suas contratações são talento e cultura. Essas duas variáveis andam juntas. Não dá para investir apenas no talento ou apenas na cultura. Você terá de unir os dois. Por isso é que empresas como Google e Facebook têm processos seletivos longos e cuidadosos.
Existe um exercício interessante que um de nossos clientes aplica em suas contratações. Depois de fazer todos os testes de conhecimento, talento e currículo, ele coloca o candidato escolhido frente a frente com quatro ou cinco pessoas da empresa que conhecem muito bem a cultura. Nessa hora, esse candidato vai responder a perguntas-chave ligadas ao estilo e ao DNA da empresa. Caso ele não tenha nada a ver com esse DNA, ele não entra. Por melhor que seja.
E como fica a gestão dessas pessoas no dia a dia, como reter esses talentos? Se você foi capaz de atrair grandes talentos para seu projeto, tenha certeza de que serão permanentemente assediados por outras empresas. Faz parte do jogo.
Como fazer com que sua equipe esteja sempre andando no limite da entrega e da satisfação?
A resposta está no comprometimento com o projeto. É preciso que haja alinhamento das pessoas com a empresa não somente quanto a propósito, mas também em estratégia e execução. Na Netshoes, chamávamos isso de “andar em bloco”. Quando a empresa tem cinco ou dez funcionários, é fácil que todos estejam alinhados, mas e quando estamos falando de 1 mil funcionários?
Queremos dar três dicas que ajudarão sua equipe a andar em bloco:
- Firmeza no propósito: toda vez que houver uma cisão no grupo, lembre-os de onde se quer chegar, relembre seu propósito. Ele é a cola do grupo, tem que ser dito, escrito e praticado constantemente.
- Clareza nos objetivos: defina o quanto antes seus objetivos para o ano e certifique-se de que todos estejam por dentro.
- Administração por OKRs: alinhe três desafios por trimestre com as pessoas da equipe e acompanhe esses pontos semanalmente, dando sinal verde, amarelo ou vermelho para o desenvolvimento de cada um.
Agora falemos de capital. Aqui há dois pontos sensíveis: fluxo de caixa e captação de recursos. Como dizem, prejuízo agride uma empresa, mas quem mata é o caixa. Não existe erro mais comum na gestão financeira do que olhar exclusivamente para a rentabilidade da empresa, se empolgar com os lucros e se perder na gestão diária do caixa, morrendo na praia sem dinheiro para pagar fornecedores ou endividado com os juros altos do banco.
Em nossa experiência com empresas da nova economia, é impressionante a quantidade de vezes que encontramos negócios bem-sucedidos em suas ideias e posicionamento de marca, mas sem qualquer estrutura financeira. O primeiro ponto é fazer bom controle de suas receitas e despesas. Faça isso. Sem esse controle você pode achar que está fazendo sucesso e logo se ver quebrado. Como já mencionamos, empresas morrem por ausência de caixa. O princípio básico aqui é ver o que acontece, com uma boa planilha que projete diariamente receitas e despesas com horizonte de pelo menos seis meses.
Mas tome cuidado na projeção: planilha aceita tudo! Seja bem pragmático para ter um cenário conservador e entender o fôlego de seu negócio. Não adianta ter um cenário otimista de receita, gastar esperando o melhor e acontecer o pior: assim você vai quebrar! O segundo ponto é a captação de recursos. Cada vez mais temos um ecossistema robusto para apoiar startups no Brasil. Existem três tipos básicos de forma de captação de recursos:
1. Recursos próprios (o famoso bootstrapping, em inglês): você e seus sócios-fundadores direta ou indiretamente (às vezes acontece aquele financiamento de “pai para filho”) aportarão recursos para o início do negócio. Aqui é preciso ter claro que se pode perder tudo que foi investido.
2. Recursos de terceiros: aqui é a ideia de dívida, de pegar dinheiro emprestado. Atenção: não é crime pegar dinheiro emprestado. Culturalmente, muitas vezes as pessoas têm medo de contrair dívidas. Dever não é ruim, ruim é não ter condição de pagar. Assim, tenha clareza do que está financiando, confira a taxa de juros para ver se é vantajosa, entenda o que é colocado em garantia.
3. Recursos de investidores: aqui estamos falando em vender um pedaço da empresa, ter um sócio. E nesse sentido estamos falando que suas decisões não serão mais 100% suas; vale o acordo de sócios. A grande vantagem é que você ganha fôlego e, se bem escolhido, um parceiro de grande valor para a evolução do seu negócio.
O maior cuidado em qualquer momento pós-captação de novo recurso é entender o dia seguinte: captar é uma vitória, mas é apenas o começo de um novo campeonato! Para cada tipo de escolha há compromissos distintos assumidos, e isso envolve maturidade de governança. Esta envolve a forma como você presta contas para seus sócios, para terceiros e para a sociedade. São um conjunto de práticas que respaldam seus processos de controle.
Uma das discussões mais populares do momento em relação às startups diz respeito à rentabilidade. Se você tem um pequeno negócio familiar, como um restaurante ou um pet shop, precisa se provar e dar lucro desde o primeiro dia. Mas o mesmo não pode ser dito sobre startups. Uma das influências que a lógica de empreendedorismo do Vale do Silício trouxe ao Brasil foi a dinâmica de empresas que não buscam lucro desde o primeiro mês. Elas buscam crescer e às vezes dão anos de prejuízos (que são financiados por investidores) sem que isso seja um problema, desde que elas estejam ganhando market share. Em algum momento, elas buscarão o lucro, ou serão vendidas, ou abrirão o capital.
5. TER O MODELO DE GESTÃO “CAMPEÃO X DESAFIANTE”
Para nós, trabalhar esses dois modelos é, entre os cinco pontos aqui listados, o mais importante para o alto rendimento na nova economia. Vamos começar com o modelo campeão, aquele que trouxe você até aqui. Bom ou ruim, não importa, toda empresa tem um modelo campeão. Se você ainda não começou seu negócio, seu modelo campeão será a forma que você encontrar para gerar vendas e receita.
Por mais que as pessoas o critiquem e apontem melhorias, ele já é vencedor e importante por ter trazido a empresa ao seu momento atual. Todas as vendas e receitas geradas não aconteceram em um passe de mágica. Por trás delas, existe um modelo de gestão que é o seu modelo campeão. Importante: não existe modelo perfeito e todos os modelos têm prazo de validade – levam empresas a um patamar de vendas até que começam a apresentar sinais de exaustão e se esgotam. Esse é o princípio que queremos apresentar aqui.
Quando isso acontece, um novo modelo campeão deve vir para substituí-lo. É possível fazer uma analogia com um piloto que está dando voltas na pista com um carro de Fórmula 1. Primeiro, ele faz um novo traçado e tira segundos, depois faz novos ajustes e lá se vão centésimos; mais tarde, com alterações mínimas, ele consegue reduzir outro tanto. Até não ter mais como melhorar. O aprimoramento no desempenho é cada vez menor ou igual a zero. Chega uma hora em que esse modelo se esgota, precisa ser melhorado. Para isso, ele para no box. Trocam-se os pneus, trocam-se algumas peças, fazem-se ajustes para voltar para a pista e recomeçar o processo.
Um erro de muitos gestores nas empresas da nova economia é não perceber que precisam ser os primeiros a destruir seu próprio modelo campeão – antes que ele acabe. Os profissionais se apegam a modelos vigentes e não sabem a hora de deixá-los para trás, quando deveriam estar fazendo o contrário: antecipando-se à exaustão do modelo atual e considerando novas possibilidades para substituí-lo.
Questione o modelo que está dando certo enquanto ele ainda dá certo. Em cinco anos de Netshoes, usamos 11 modelos diferentes de marketing. Reinventamos algumas vezes a área, sempre antes que um chegasse ao limite. Você deve fazer o mesmo e mudar seu próprio modelo vencedor constantemente, desafiando-o para que venha um novo e melhor. Não aplique o modelo desafiante todo de uma vez. Em outras palavras, não dê cavalo de pau na sua empresa.
Teste o modelo novo em, por exemplo, 5% ou 10% da sua base de clientes. Se ele for melhor que o modelo campeão nesses 10%, aplique em mais 10%. Faça assim repetidamente, aumentando o alcance do teste. Novamente, teste e ajuste até conseguir evidências de que o modelo pode ser melhor. Normalmente, um teste bem-sucedido para mais de 65% pode ser aplicado para a base toda. Se isso acontecer, você encontrou seu novo modelo campeão.
O princípio é: teste rápido e barato. Erre rápido e barato. Ideias que avançam seguem em frente. Ideias que não triunfam ficam para trás. Mais racional, menos emocional.
Importante: campeão x desafiante não é uma ação isolada, e sim um modelo de gestão. Deve ser aplicado em toda a empresa. Não é algo de marketing ou vendas, é uma forma de pensar. É um modelo que deve ser aplicado em todas as empresas independentemente do setor de atuação ou do tamanho de cada uma delas. Encontrou um modelo vencedor? Comece tudo de novo. Sim, é cansativo. É exaustivo. Mas, na nova economia, não tem outro jeito.
DADOS PARA QUEM NÃO TEM DADOS
1. Na audiência do Facebook: qualquer um que tenha uma página no Facebook sabe o perfil de seus fãs. Procure o perfil de sua audiência na área de administração de sua fanpage para entender qual o gênero de seus fãs, onde moram etc.
2. No Google: pesquise no buscador dados sobre as pessoas que consomem seu produto. Se você tiver uma agência de viagens, quem compra pacotes no Brasil? Quanto gasta por ano o turista de seu estado? Procure reportagens, pesquisas, informações de órgãos públicos. Para quem não tem nada, isso já serve como base.
3. Em cafés da manhã: marque um café com seus clientes. Chame de cinco a oito deles para fazer perguntas, mostrar produtos novos, entender o que acham dos preços, do frete, do atendimento, do site. Faça um roteiro com as informações de que você precisa e as perguntas que você tem de fazer para conseguir tais informações. Quando faz isso com seus clientes, você os cativa. Eles se sentem ouvidos – e isso tem muito valor.
4. Observando a concorrência: teste o serviço de seu concorrente, entre na fanpage, compre um produto, use um serviço. Não tenha vergonha de copiar (e melhorar!) o que seu concorrente está fazendo. Pesquise o que o mundo está fazendo em sua área, veja o que é bom e seja rápido em implementar.
5. Em pesquisas: envie um e-mail com um questionário para sua clientela (há várias ferramentas para isso) e mande uma pesquisa para sua base. Eles podem avaliar sua loja, por exemplo, e dar dicas simples para melhorar o serviço, como sugerir um estacionamento. Abra seu coração e ouça. Nós juramos que os clientes adoram a chance de se expressar – isso mostra que sua marca está se preocupando com o cliente.
6. Customizando a audiência: você pode usar sua base de e-mails para customizar sua audiência no Facebook. Além de fazer campanhas, você automaticamente saberá o perfil dessa base – de onde ela vem, qual o gênero etc. Por isso, o recomendável é colocar nessa ação apenas os principais clientes. Com esse perfil, é possível rever todo o plano de marketing e voltar suas ações para as pessoas que compram, apreciam e repetem seu produto ou serviço.
7. Usando o Google Analytics: é possível extrair informação importante no seu site e você deve instalar essa ferramenta ali imediatamente. Ela mostra, por exemplo, o bounce rate (a quantidade de pessoas que entram, olham e fecham a janela). Se essa taxa for muito alta, vale entender por que as pessoas não permanecem no site. Você só aprende usando. É simples e não precisa de expertise, mas precisa de paciência.
ESCOLHA AS PESSOAS CERTAS
Buscar as melhores pessoas é um imperativo da nova economia; pessoas são, de fato, o ativo mais importante de qualquer projeto. Elas podem contribuir de várias formas, como funcionárias contratadas, prestadoras de serviço, consultoras ou sócias minoritárias.
Não importa o modelo; o importante é reunir os melhores e mantê-los alinhados com o propósito do negócio, segundo o livro Mude ou morra. Também são desejáveis profissionais com perfis complementares.
Na hora de procurar os melhores, Renato Mendes e Roni Cunha Bueno alertam para o momento de vida de cada um, criando um cardápio de cinco perfis (com clara preferência pelos 4 e 5).
1. Profissionais que buscam segurança: como dão muito valor à segurança e costumam buscar estabilidade, tendem a se encaixar em ambientes com baixa volatilidade, como algumas grandes empresas ou em cargos públicos. Costumam sofrer em startups, em que as prioridades mudam o tempo todo e correm-se muitos riscos. Alguém que teve filho recentemente pode se encaixar nesse perfil.
2. Profissionais movidos por remuneração: a não ser que seja uma vaga temporária ou um momento que demande um talento específico, evite pessoas com esse perfil, porque não costumam ficar muito tempo na mesma empresa. Estão sempre de olho na próxima oportunidade de ganhar mais, em sua empresa ou em outra. A ausência de conexão por propósito entre candidato e empresa deve sempre ser evitada. Claro que ninguém trabalha de graça ou por caridade, mas busque o que os autores chamam de “ganância boa”. É diferente da ganância por ganância.
3. Profissionais que buscam equilíbrio entre vida pessoal e profissional: semelhantes às pessoas que dão muito valor à segurança, podem ser boas, mas precisam ser encaixadas em situações pertinentes ao seu momento ou perfil. Não coloque alguém que busca equilíbrio entre vida pessoal e profissional em um projeto com características de startup, porque ele será infeliz.
4. Profissionais que querem se desenvolver: pessoas que buscam desenvolver-se profissionalmente são as favoritas dos autores. Elas entendem que estão ali porque estão aprendendo e costumam ter alto índice de realização. Vão crescer com o negócio. O desafio na gestão dessas pessoas é que elas costumam se entediar facilmente a menos que sejam permanentemente desafiadas. Em geral, são fast learners, pessoas que aprendem coisas novas muito rápido e sempre buscam mais.
5. Profissionais movidos a reconhecimento: costumam dar um pouco mais de trabalho, porque demandam horas de conversa, mas, ao mesmo tempo, costumam ser muito leais e parceiras. São aquelas pessoas que tipicamente querem fazer história com você!
EXERCÍCIO: DESENVOLVA O MODELO DE DESEMPENHO DESAFIANTE
Primeiro, descubra qual é seu modelo campeão – aquele que o trouxe até aqui. Olhe para os resultados que está alcançando, os processos, a equipe e as tecnologias usadas. Destrinche cada detalhe do seu modelo atual e entenda por que ele funcionou até o momento.
Agora, pergunte-se como você faria tudo diferente. Dê um passo para trás e olhe de fora. O que você faria se tivesse de começar do zero hoje? Em uma folha em branco, como desenharia esse novo modelo? Saia da realidade que está vivendo e questione processo, equipes, resultados, tecnologias. É o momento de não dizer “não” – não consigo, não tenho recursos, aqui não dá, não é para mim… Transforme o não em sim. É a hora de ter ideias mirabolantes. É hora de brainstorming.
Nesse processo, sair do dia a dia é realmente um desafio; é preciso desvencilhar-se emocionalmente, como se você não tivesse nada a ver com a empresa. Mas funciona. Depois disso, você encontrará várias oportunidades. Para não perder tempo, depois de listar em um papel todas essas oportunidades de melhorias, você deve fazer duas coisas: hierarquizar e testar rápido. Hieraquizar ajudará a identificar qual ideia deve ser testada primeiro.
Escolha até três hipóteses para serem testadas em pequena escala. Separe um dinheiro que pode ser perdido; lembre-se de que são testes e não há certeza alguma de as coisas triunfarem. Reúna as pessoas necessárias para rodar os testes, acreditando que serão vencedoras, porque você vai precisar de energia total para fazê-los vingar.
Como se testa? Erro pequeno, aprendizado rápido. Ou seja, testes rápidos e baratos. Você precisará seguir testando até ter evidências reais e – de preferência – numéricas. Então, deverá comparar o novo modelo com o atual, mas nem sempre pela performance financeira. O critério pode ser o que é mais rápido, o mais fácil, ou o que tem maior chance de escalar. Consulte seus KPIs; ali estão os números que realmente importam.
Fonte: Artigo publicado na revista HSM Management por Renato Mendes e Roni Cunha Bueno