Como os profissionais em vendas manipulam o sistema

Vendedores frequentemente exploram programas de incentivo para maximizar seus ganhos por meio de diversas estratégias, com impactos prejudiciais no desempenho da empresa. Táticas comuns incluem adiar vendas para períodos futuros, falsificar dados e oferecer descontos ou incentivos excessivos para fechar negócios rapidamente, entre outras práticas. Para combater essas ações, as empresas devem usar dados para detectar irregularidades, revisar os planos de incentivo para eliminar brechas e estabelecer um monitoramento contínuo. A comunicação e a educação sobre comportamentos aceitáveis também são fundamentais. No entanto, nem todas as manipulações exigem ação imediata; algumas podem ser toleradas se tiverem impacto mínimo no desempenho e se sua repressão causar mais perturbação do que benefício para a organização de vendas. Assim, as empresas devem adotar um processo contínuo para identificar e mitigar fraudes, equilibrando essa necessidade com a manutenção da produtividade e motivação da equipe de vendas.

Entre 2002 e 2016, funcionários do Wells Fargo exploraram o programa de incentivos de vendas do banco. Eles abriram milhões de contas não autorizadas e inscreveram clientes em serviços com taxas para atingir metas irrealistas estabelecidas pela administração. Apesar das evidências claras de má conduta, os líderes da empresa ignoraram o comportamento, segundo um acordo civil do Departamento de Justiça. O banco acabou pagando mais de 3,7 bilhões de dólares em multas. Executivos seniores também foram responsabilizados, incluindo um que foi condenado à prisão domiciliar como parte de um acordo judicial.

Embora o comportamento criminoso no caso do Wells Fargo seja um exemplo extremo, profissionais de vendas que trabalham sob programas de incentivo ou comissão frequentemente exploram o sistema para benefício próprio. Qualquer pessoa que já tenha trabalhado em uma equipe de vendas sabe que é comum os vendedores adiarem grandes negócios para o próximo mês se perceberem que não vão atingir sua cota no período atual. Existem muitas outras formas de manipular o sistema, e o impacto geral desse comportamento pode ser enorme.

Para entender melhor a extensão do problema, nossa equipe de pesquisa conduziu, em 2023, entrevistas com 38 vendedores, líderes de vendas e executivos de alto escalão em 19 setores, que variam de controle de pragas a fabricação de equipamentos pesados, passando por software e serviços financeiros. Durante essas conversas, identificamos 64 exemplos distintos de fraudes relacionadas a incentivos e categorizamos os métodos mais comuns pelos quais os vendedores manipulam os programas da empresa. Também realizamos uma pesquisa com aproximadamente 100 profissionais de compensação de vendas em uma conferência sobre incentivos em 2023 e descobrimos que 83% enfrentavam dificuldades para impedir que vendedores burlassem o sistema.

É claro que as empresas não devem evitar programas de incentivo por completo, apesar dos riscos envolvidos. Quando bem projetados, esses programas podem melhorar o desempenho dos vendedores e aumentar a receita. No entanto, os gestores precisam entender como seus programas estão sendo utilizados — e abusados — pelos funcionários. Neste artigo, baseamos nossas recomendações em entrevistas e em nossa experiência coletiva com pesquisa de compensação de vendas e gestão de programas de incentivo para grandes empresas dos setores bancário, de software, consultoria e hardware de informática. Apresentamos um inventário das táticas mais comuns utilizadas por vendedores e um modelo para abordar e mitigar a manipulação de incentivos de vendas, incluindo casos em que essa manipulação pode ser tolerada.

Os esquemas mais comuns

Ao projetar planos de incentivo, os gestores muitas vezes focam apenas nas técnicas de manipulação que já encontraram no passado, sem considerar a ampla gama de comportamentos que podem surgir. Para ampliar essa perspectiva, desenvolvemos uma tipologia com oito categorias distintas de fraudes em incentivos de vendas — cada uma podendo ser relativamente inofensiva ou de alto risco, dependendo do contexto.

1. Adiamento estratégico de vendas

Essa técnica envolve adiar o fechamento de vendas para um período futuro a fim de otimizar os ganhos com incentivos. Um dos entrevistados nos contou que, em sua empresa, a cada dois anos alguns representantes seguravam o máximo de pedidos possível entre outubro e dezembro e os submetiam em janeiro. O acúmulo de vendas resultava em um desempenho extraordinário e em comissões muito altas por superarem significativamente as metas estabelecidas.

2. Parceria lucrativa

Vendedores podem fazer acordos com clientes para manipular processos internos da empresa e garantir um melhor negócio para o comprador e um bônus maior para si mesmos. Em uma entrevista, ouvimos sobre banqueiros pessoais que instruíam clientes a abrir contas apenas para aproveitar promoções (o que lhes rendia comissão) e depois fechá-las ao término do período promocional.

3. Desperdício de vendas

Essa prática envolve induzir clientes a tomar decisões que beneficiam o vendedor, mas não a empresa ou o próprio cliente. Um dos entrevistados relatou que, em uma empresa onde trabalhou, vendedores ofereciam descontos para persuadir clientes a contratar níveis de serviço desnecessários, já que a comissão era maior para os planos mais caros. Embora os vendedores se beneficiassem, a empresa pagava comissões mais altas sem necessidade, e os clientes gastavam mais dinheiro com serviços que não precisavam, o que poderia gerar insatisfação e cancelamentos.

4. Manipulação de segmentação

Alguns vendedores direcionam seus esforços para segmentos de clientes que oferecem melhores oportunidades de ganho em incentivos, em vez de seguir os segmentos estratégicos definidos pela empresa. Um entrevistado mencionou que isso era comum entre associados de atendimento ao cliente responsáveis tanto por chamadas de vendas quanto por chamadas de serviço. Para maximizar sua comissão, muitos evitavam atender ligações de serviço, preferindo focar nas chamadas de vendas.

5. Recompensas e punições

Vendedores podem oferecer incentivos, fazer promessas, ameaças ou impor penalidades para incentivar comportamentos de clientes que maximizem seus bônus. Em uma companhia aérea, por exemplo, alguns agentes dispensavam taxas de bagagem para passageiros que assinavam o cartão de crédito da empresa, garantindo um bônus generoso para si mesmos.

6. Enganar clientes

Essa tática envolve fornecer informações enganosas ou omitir detalhes para acelerar o fechamento da venda. Em uma empresa de serviços financeiros, alguns vendedores informavam falsamente aos clientes que não poderiam concluir determinadas transações por telefone, direcionando-os a um consultor financeiro. Essa indicação resultava em bônus maiores para os vendedores.

7. Falsificação de dados

Neste caso, os vendedores manipulam o sistema de gerenciamento de vendas inserindo informações falsas ou omitindo detalhes para aumentar seus ganhos com incentivos. Em uma entrevista, ouvimos que alguns vendedores frequentemente acessavam o sistema e adicionavam seus nomes a transações nas quais não haviam participado para aumentar suas comissões.

8. Clientes fictícios

Criar contas de clientes falsas com a ajuda de amigos, parentes ou colegas, ou simplesmente fabricar clientes inexistentes, é outra estratégia comum. Alguns vendedores pedem a conhecidos que se passem por compradores, relatou um entrevistado. Após receberem a comissão pela “venda”, os falsos clientes cancelam o serviço.

Antecipando Problemas

Essa tipologia de táticas pode ajudar líderes de vendas e gestores de planos de incentivo a pensar como jogadores quando buscam sinais de fraude em planos existentes e ao projetar e implementar novos. A eficácia desse processo varia de acordo com a capacidade dos gestores de antecipar todas as formas como os planos de incentivo podem ser distorcidos para interesses próprios — o que os estudiosos de gestão Mark Seabright e Marshall Schminke chamam de “imaginação imoral”.

Gestores de incentivos com pouca imaginação imoral devem pedir a líderes de vendas e profissionais de confiança que revisem rascunhos dos planos de incentivo para identificar maneiras pelas quais eles possam ser explorados. Revisar a lista de táticas comuns pode estimular todos a identificar brechas e oportunidades para burlar regras ou cometer fraudes. Os gestores podem usar essas informações para esclarecer regras, desenvolver mecanismos de proteção contra manipulação e criar protocolos de monitoramento.

Os líderes de vendas devem pensar como jogadores ao buscar sinais de fraude em planos de incentivo existentes e ao projetar e implementar novos.

Os gestores de planos também podem usar essa tipologia para detectar fraudes em programas já em vigor. Quando as equipes de incentivo realizam auditorias nos dados de vendas, essa abordagem pode ajudá-las a identificar sinais de irregularidades ou falhas no desenho do plano. Em geral, isso significa examinar os dados nos sistemas de gestão de vendas em busca de padrões incomuns no comportamento dos vendedores, no fechamento de negócios, na medição e registro de receitas, além do fluxo de dados e cálculos que determinam os pagamentos de incentivos.

Veja como duas empresas com as quais trabalhamos ou assessoramos usaram essa tipologia para complementar seus protocolos padrão e identificar comportamentos inadequados.

O gestor de incentivos de uma grande instituição financeira nos Estados Unidos percebeu que o desempenho de abertura de contas em uma filial superava o de outras unidades comparáveis na região. Diante dessa irregularidade, a equipe suspeitou que um pequeno grupo de banqueiros estava utilizando a tática de clientes falsos. Eles iniciaram uma auditoria de todas as contas de depósito abertas nos últimos 12 meses e marcaram aquelas encerradas em menos de 90 dias. A análise revelou que dois banqueiros rotineiramente abriam contas falsas e as fechavam após serem reconhecidos pelo sistema de incentivos. A empresa demitiu esses funcionários e ampliou o monitoramento desse padrão de atividade.

E lembre-se do exemplo do call center e do comportamento de manipulação de segmentação. Após uma semana de monitoramento intensivo, a equipe de planejamento de incentivos determinou que 15% dos atendentes estavam ignorando uma grande parte das chamadas recebidas, forçando outros membros da equipe a atendê-las, para que pudessem focar em chamadas de saída que geravam comissão. Os líderes corrigiram esse comportamento por meio de conversas individuais, e a equipe de incentivos implementou um processo para identificar esse tipo de conduta no futuro.

Algumas dessas práticas podem parecer crimes sem vítimas ou relativamente insignificantes. Registrar um pedido de cliente no primeiro dia do mês, em vez do último dia do mês anterior, por exemplo, pode irritar a equipe de orçamento, mas ter impacto mínimo no desempenho financeiro. No entanto, enganar clientes, enviar dados falsos ou criar clientes fictícios pode comprometer relacionamentos comerciais, gerar riscos graves e, em última instância, resultar em consequências financeiras catastróficas.

Avalie Seu Plano de Incentivos

Que medidas os gestores devem tomar para minimizar comportamentos fraudulentos? Comece identificando quais estratégias seus vendedores estão usando e avalie o grau da infração ética. Para determinar a extensão do problema, pergunte-se se a prática envolve muitos representantes de vendas, apenas alguns ou um único indivíduo. Em seguida, considere as consequências desse tipo de fraude para os relacionamentos com clientes, o desempenho financeiro e os riscos legais, de reputação e outros.

Vendedores que manipulam o sistema podem ver seu comportamento como uma leve flexibilização das regras, sem a intenção de causar danos reais à empresa ou aos clientes. E é verdade que nem todas as formas de fraude em vendas são iguais. Mesmo quando uma determinada tática de fraude é comum, seu impacto no desempenho da empresa pode ser relativamente insignificante e não representar um problema ético grave. Em outros casos, no entanto, o impacto pode ser severo.

Considere a situação enfrentada pela fornecedora de sistemas de segurança Vivint Smart Home. De acordo com a Comissão Federal de Comércio, em 2021, cerca de 130 representantes de vendas comissionados da empresa cometeram regularmente roubo de identidade para aprovar clientes para empréstimos. Se um cliente não se qualificava para o crédito, os vendedores usavam ilegalmente o histórico financeiro de outra pessoa com o mesmo nome. Falsificar dados dessa maneira—prática muitas vezes chamada de “white paging”—é uma violação de diversas leis. A empresa admitiu a irregularidade e concordou em pagar uma multa civil de US$ 15 milhões e uma multa adicional de US$ 5 milhões aos clientes afetados.

Dado que um número significativo de vendedores estava envolvido na prática e considerando os danos reputacionais e as multas legais incorridas, classificaríamos essa atividade de manipulação no quadrante “disruptivo e generalizado”. Empresas que se encontram nessa situação devem alertar imediatamente as lideranças das áreas de vendas, jurídica, de conformidade e de gestão de riscos. Elas devem desenvolver um plano de remediação para os clientes afetados e, em consulta com o setor de Recursos Humanos, abordar o problema de forma rigorosa, podendo incluir a demissão dos vendedores envolvidos. Além disso, a empresa deve implementar controles rigorosos para garantir que o comportamento não se repita.

As empresas podem optar por não corrigir todas as táticas de manipulação que identificam. De fato, pode ser preferível tolerar certas práticas que têm baixo impacto ou ocorrem raramente.

Depois de determinar a extensão dos esquemas fraudulentos, os líderes devem considerar cuidadosamente a necessidade de modificar o plano de incentivos de vendas. Eles devem avaliar as consequências esperadas do comportamento em relação à tolerância ao risco da organização. Na maioria dos casos, os executivos concluirão que tolerar fraudes em vendas não é uma opção e que o plano comprometido precisa ser ajustado.

Nos casos em que há consenso para resolver o problema, recomendamos o seguinte processo em quatro etapas.


1
Use dados para identificar como os vendedores estão explorando o sistema.

Retomemos o exemplo dos funcionários de uma companhia aérea que recebiam um bônus em dinheiro para cada passageiro que se inscrevia no cartão de crédito co-branded da empresa. Funcionários do balcão de check-in, contrariando a política da empresa, ofereciam a inscrição no cartão e propunham isentar as taxas de bagagem caso os clientes preenchessem a solicitação no momento. Esses funcionários tinham permissão para isentar taxas de bagagem por diversos motivos, como quando os clientes já possuíam o cartão co-branded, eram viajantes frequentes de alto nível ou como parte de um esforço de recuperação de serviço. Isso dificultava a identificação da fraude. A recomendação seria que a companhia aérea utilizasse seus sistemas de informação para identificar os funcionários no quartil superior de ganhos com incentivos de cartão de crédito e cruzasse o momento das inscrições nos cartões com as isenções de taxas de bagagem concedidas por esses agentes.

2
Revisar o plano de incentivos de vendas.

Se a fraude for resultado de ambiguidades nas diretrizes do plano de incentivos, os documentos devem ser atualizados para especificar claramente quais comportamentos e procedimentos são aceitáveis ou inaceitáveis. Se a fraude envolver a violação de regras ou o fornecimento de informações falsas, deve-se incluir uma linguagem explícita proibindo tais práticas e reforçando as consequências para os funcionários que desrespeitarem as políticas. As penalidades podem incluir a negação ou a recuperação de incentivos pagos e ações disciplinares.

Considere o caso de uma instituição financeira onde os gerentes de agência instruíam secretamente os clientes a abrirem contas de cartão de crédito, mas sem usá-las (mantendo o cartão apenas para emergências), o que garantia que os gerentes recebessem comissões. Como resposta, os planos de incentivo foram modificados para exigir que os clientes utilizassem os cartões antes que os gerentes recebessem suas comissões. Essa mudança significava que os gerentes não recebiam imediatamente o crédito de incentivo por contas recém-abertas, e que a empresa precisava coletar dados continuamente para determinar quando os cartões eram usados para compras, transferências de saldo e adiantamentos em dinheiro. No entanto, esses foram compromissos considerados adequados, visto que apenas cartões de crédito em uso ativo geram receita.

3
Estabelecer monitoramento contínuo dos processos de vendas.

Os sistemas de gestão de vendas devem ser atualizados para identificar e rejeitar fraudes. Exemplos incluem sistemas que detectam cartões de crédito sem nenhuma atividade ou novas solicitações de cartão acompanhadas de isenções de taxas de bagagem. Além disso, devem ser criados relatórios e painéis de controle para dar visibilidade a transações suspeitas. Por exemplo, um banco pode coletar dados sobre agências com altas taxas de fechamento de contas em até 60 dias após a abertura. Ou pode analisar o desempenho de gerentes cujas vendas de novos cartões de crédito superam a média da região.

Atividades de vendas que não podem ser rastreadas apenas por meio de dados podem exigir monitoramento e inspeção humana. Isso pode incluir verificações aleatórias para garantir conformidade com as regras, monitoramento de chamadas, auditorias de transações, inspeções de conformidade em campo ou verificações das compras feitas pelos clientes. Análises preditivas e inteligência artificial devem ser incorporadas aos esforços de monitoramento contínuo.

4
Comunicar as mudanças à equipe de vendas.

Depois que o plano de incentivos for atualizado e os sistemas de coleta e relatório de dados forem estabelecidos, a liderança de vendas deve comunicar qualquer nova política ou mudança no plano de incentivos, além da adição de monitoramento para detectar e prevenir futuras manipulações. Os líderes também devem discutir quaisquer problemas de fraude descobertos no processo. A explicação das políticas deve ser combinada com uma revisão do código de conduta da empresa. Organizações de vendas que ainda não possuem um código de conduta devem criar um e compartilhá-lo, a fim de prevenir táticas de manipulação e reforçar as consequências desse tipo de comportamento.

Se as etapas acima forem seguidas com cuidado, a manipulação identificada será reduzida ou eliminada, até que a próxima vulnerabilidade no plano seja descoberta. Em nossa experiência, empresas maiores levam mais tempo para adotar, implementar e comunicar correções nos planos de incentivos que estão sendo explorados. As práticas de monitoramento e as consequências para quem quebra as regras também devem ser continuamente revisadas com os representantes de vendas. Recomendamos que as empresas sejam diligentes ao compartilhar e revisar painéis de controle e relatórios com a liderança de vendas para confirmar o progresso.

Talvez Você Não Responda

As empresas podem optar por não corrigir todas as táticas de manipulação que descobrem. De fato, pode ser preferível tolerar certas estratégias que têm baixo impacto ou ocorrem com pouca frequência. Isso porque abandonar ou modificar um plano de incentivos que funciona razoavelmente bem pode ter desvantagens: mudanças podem desviar o foco da equipe de vendas, resultando em uma queda na produtividade. Além disso, os vendedores podem sentir que as mudanças são injustas, levando à resistência, desmotivação ou até mesmo ao aumento da rotatividade. Por fim, alterações no plano podem gerar consequências indesejadas, como novas oportunidades de fraude, pagamentos de incentivos mais altos do que o esperado ou a ruptura de relacionamentos com clientes já estabelecidos.

Uma empresa que estudamos, uma revendedora de software e provedora de soluções avaliada em 20 bilhões de dólares, ilustra bem esse tipo de decisão. Sob um novo plano de incentivos, os representantes de vendas recebiam uma comissão mensal baseada na margem bruta. Por exemplo, um representante que vendesse produtos com uma receita total de 40.000 dólares e um custo de mercadorias vendidas de 10.000 dólares ganhava uma porcentagem de comissão sobre a margem de 30.000 dólares. Logo após a implementação do plano de incentivos, a equipe de operações de vendas identificou uma prática generalizada de postergação de pedidos. Quando os representantes percebiam que não atingiriam suas metas mensais, seguravam pedidos feitos no final do mês e os registravam no início do mês seguinte. A equipe de operações de vendas classificou esse problema como uma manipulação incômoda generalizada, ou seja, de alta frequência, mas baixo impacto.

Os analistas da empresa sugeriram modificar o plano para ampliar a janela de vendas de mensal para trimestral, argumentando que isso reduziria a frequência da postergação e o número de transações adiadas. No entanto, os líderes de vendas se opuseram, percebendo que seria melhor tolerar o comportamento do que tentar corrigi-lo. No plano atual, os representantes otimizavam suas comissões segurando negócios por alguns dias ou, no máximo, uma semana. Se a janela de vendas fosse estendida de mensal para trimestral, o comportamento provavelmente continuaria, mas os representantes poderiam reter negócios por semanas ou até mais tempo. Isso aumentaria o ciclo de vendas, reduziria a velocidade das transações e desaceleraria o crescimento das vendas. A proposta de mudança foi rejeitada, e os gestores passaram a monitorar de perto o comportamento para garantir que o problema não se tornasse mais prejudicial.

Quase todos os líderes e representantes de vendas que entrevistamos nos disseram: “Todos os planos de incentivos de vendas podem ser manipulados”. As pessoas naturalmente buscarão maneiras de maximizar seus benefícios pessoais e alcançar seus objetivos da forma mais fácil e rápida possível, às vezes às custas da integridade.

O processo que descrevemos neste artigo não é uma solução única e definitiva, mas um exercício contínuo. Todo novo plano ou revisão será analisado em busca de oportunidades para flexibilizar ou violar regras, ou até mesmo para fraudar de forma mais grave. Pensar como um vendedor ajudará a criar planos de incentivo menos suscetíveis à manipulação e a limitar a tendência humana de buscar atalhos antiéticos.


Fonte:

Periódico Harvard Business Review, edição Março – Abril de 2025

Sobre os autores:

Timothy M. Gardner é professor associado de gestão na Jon M. Huntsman School of Business da Utah State University.

Colin Wong é um consultor independente especializado em compensação por incentivos e gestão de desempenho de vendas.

Rick Butler é vice-presidente de compensação global de vendas na ServiceNow.