As mulheres representam o grupo econômico mais importante do planeta. Uma força de trabalho de 1 bilhão de pessoas, responsável pela maior parte do gasto mundial anual em bens e serviços. Sofisticadas e exigentes, as consumidoras lideram as decisões de compra em praticamente todos os setores, segundo esta reportagem
As mulheres representam o grupo econômico mais importante do planeta. Uma força de trabalho de 1 bilhão de pessoas, responsável pela maior parte do gasto mundial anual em bens e serviços. Sofisticadas e exigentes, as consumidoras lideram as decisões de compra em praticamente todos os setores, segundo esta reportagem.
Talvez o dinheiro não possa comprar amor, mas, para a grande maioria das mulheres, compra felicidade. Segundo Michael Silverstein e Kate Sayre, sócios do The Boston Consulting Group (BCG) e autores do livro Women want more: how to capture your share of the world’s largest, fastest-growing market (ed. HarperBusiness), as pressões financeiras geram estado emocional negativo nas mulheres.
Quando estão preocupadas com dinheiro, sentem-se tristes, instáveis, menos importantes e até insatisfeitas com sua aparência, e tentam aliviar sua angústia comprando bens que as façam sentir-se mais atraentes e saudáveis ou contratando serviços que as ajudem a resolver alguns de seus problemas mais urgentes.
Para as mulheres, dinheiro é um meio. É importante como símbolo de status ou influência em casa, porque dá a elas flexibilidade e lhes permite “comprar tempo” por meio da contratação de atividades de baixo valor. Essa é uma das conclusões da pesquisa global sobre os gostos das mulheres, levada a cabo pelos analistas do BCG em 2008.
Doze mil mulheres de diversos extratos sociais de 22 países responderam sobre carreira, renda, relacionamento, comportamento de compra, esperanças e medos. “As mulheres se sentem ignoradas pela maioria das empresas, mas há dois setores com os quais estão extremamente insatisfeitas: serviços financeiros e saúde”, dizem os analistas do estudo.
Tempo, dinheiro e amor, nessa ordem, são o que mais desejam. Casamento duradouro, família saudável, relações sólidas com amigos e colegas vêm em seguida. Desejam soluções rápidas e práticas.
Como consumidoras, querem ser ouvidas pelas empresas, que registrem suas insatisfações e que façam produtos e serviços voltados a suas necessidades atuais e urgentes. Também têm esse desejo como profissionais e gestoras, conforme mostram os gráficos mais abaixo.
Desigualdade de gêneros nas empresas brasileirasCom o fato de a presidência do País ser agora ocupada por uma mulher, o Brasil deve subir no ranking de um dos mais respeitados indicadores mundiais da desigualdade de gêneros, o Gender Gap Indicator, produzido anualmente pelo Fórum Econômico Mundial (WEF) e pela Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.
Sua posição no ranking de 2010 foi muito ruim; ficou em 85º lugar entre 134 países investigados, atrás de muitos países considerados mais subdesenvolvidos. O WEF mede também a desigualdade de gêneros nas empresas, no “Corporate Gender Gap Report”, e os principais indicadores aparecem a seguir:
Dados adicionais:
34,76% dos funcionários de empresas são mulheres;11% dos CEOs de empresas são mulheres.
A meta de mais um
As mulheres são o grupo de consumidores mais exigentes do planeta e o maior mercado emergente da história: correspondem a duas vezes os PIBs indiano e chinês juntos. Atualmente, há 1 bilhão de mulheres que trabalham –46% da força de trabalho mundial, segundo a escola de administração Insead–, cifra que deve crescer para 1,2 bilhão até 2014.
Hoje, o gênero feminino é responsável por 64% dos US$ 18,4 trilhões gastos anualmente em bens de consumo em todo o globo. Nos países desenvolvidos, decidem mais de 80% das compras de categorias que vão de móveis, alimentos e saúde a eletrônicos, férias e automóveis.
Em informativo de 2009, o banco Goldman Sachs exortou as empresas a tomar nota desse crescente poder e a prestar atenção à mudança de rumo nos gastos: as mulheres tendem a concentrar-se mais em saúde, educação e bem-estar de seus filhos.
Em sua carteira, há muito dinheiro para gastar. As trabalhadoras do mundo têm US$ 9 trilhões disponíveis para compras não essenciais. Desse total, a metade está em mãos dos 60 milhões de mulheres que ganham mais de US$ 45 mil por ano. Nos países desenvolvidos, 40% das mulheres controlam de 91% a 100% das despesas do lar. Três em cada dez (29%) geram toda (ou quase toda) a renda familiar, e seis em dez contribuem com metade.
Segundo dados publicados pela revista Newsweek, em 2024, as mulheres do mundo desenvolvido estarão ganhando mais do que os homens. Além disso, a organização inglesa Centre for Economic Business Research estima que, em 2020, 53% dos milionários do planeta serão “milionárias”.
O motor mais importante do crescente poder econômico do gênero feminino é a educação. Metade dos estudantes universitários do mundo são mulheres. Em países emergentes como Brasil, Emirados Árabes Unidos e Rússia, as graduadas superam os graduados. Melhorar o acesso das jovens à educação pode trazer benefícios impensados. De acordo com o BCG, há forte correlação entre bem-estar do país e bem-estar das mulheres.
Oferecer licença-paternidade, a fim de que o homem ajude a mulher após o parto, e propiciar serviços de saúde de excelência, específicos para elas, podem incrementar o PIB de uma nação em 35%. O Center for Work-Life Policy, que promove políticas destinadas a elevar a produtividade e melhorar o bem-estar familiar, estima que tanto nos países do BRIC como nas próximas nações emergentes (N-11: Bangladesh, Egito, Indonésia, Irã, México, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Coreia do Sul, Turquia e Vietnã) a força de trabalho feminina poderá incrementar a renda per capita em 14% até 2020, e em 20% até 2030.
Em seu último livro, The little big things: 163 ways to pursue excellence (ed. HarperBusiness), Tom Peters dirige-se a seus leitores masculinos e lhes implora, literalmente, que abandonem as analogias esportivas e comecem a usar o pronome feminino para falar com seus principais clientes. “Depois de uma década e meia de estudos, cheguei à conclusão de que os homens não podem criar experiências de compra para o público feminino com eficiência, da mesma maneira que não podem vender ou fazer marketing eficiente para as mulheres. Também concluí que os homens que pensam o contrário são uns iludidos”, escreve Peters.
O problema não tem solução, porque se trata de questão de gênero. “Os homens se dirigem às mulheres de maneira linear, com pouca reflexão. Elas, em troca, veem o outro lado de todas as coisas, encontram curvas e apreciam as voltas do caminho.”
O explosivo mercado feminino oferece grandes oportunidades para desenvolver e vender novos produtos e serviços, mas também apresenta enorme desafio para as organizações, que não apenas deverão começar a pensar diferente, mas também a criar ambientes nos quais as mulheres possam prosperar e pôr em ação suas habilidades. Afinal, elas entendem melhor que ninguém as necessidades de outras mulheres.
Algumas pistas
Segundo Silverstein e Sayre, as mulheres enfrentam “o triplo desafio do tempo”: a pressão por atender a exigências diversas e conseguir acomodar, nas horas disponíveis, tudo o que querem conseguir. Primeiro, devem cumprir muitas tarefas em um dia.
Segundo, têm várias prioridades em conflito. Terceiro, quase nunca lhes sobra um momento para os assuntos pessoais. Não conseguem estar um instante sozinhas para ler, caminhar ou simplesmente contemplar o que está a seu redor. Estão muito agoniadas com as tarefas do lar, os filhos e o trabalho para acrescentar mais preocupações em sua lista. Em consequência, só lhes interessam os bens e as empresas que os produzem se proporcionam o que procuram.
Os autores destacam seis categorias-chave de produtos para consumidoras:
alimentos;beleza;vestuário;cuidados com o corpo;serviços financeiros;saúde.As duas últimas –e, em menor medida, também os automóveis e equipamentos eletrônicos– encarnam grande desafio para as empresas, já que as mulheres se sentem permanentemente decepcionadas e exasperadas pela qualidade dos serviços obtidos.
O que elas amamEm quase todo o mundo, mães preparam a comida da família e querem fornecedores que lhes ofereçam produtos saudáveis, práticos e que tenham preços acessíveis. A cadeia de alimentos orgânicos e preparados Whole Foods, presente nos Estados Unidos, Canadá e Inglaterra, soube conquistar um lugar privilegiado entre o público feminino preocupado com alimentação, especialmente as solteiras que trabalham, as mães sem problemas de dinheiro e as mulheres com mais de 55 anos.
A Whole Foods vende cardápios completos para a família e as crianças em idade escolar, algo muito conveniente para as mães que trabalham fora de casa. Na área da beleza, as consumidoras desejam produtos que melhorem sua aparência, o corpo e a saúde e que lhes ofereçam bem-estar. Sempre esperam que o próximo lançamento lhes dê uma resposta melhor.
A moda acessível, tão bem explorada pelas redes Zara, da Espanha, e H&M, da Suécia, é outra categoria na qual as mulheres depositam seus desejos de se verem melhor. Querem roupas de vanguarda a preços normais e soluções “porteira fechada”.
A H&M, por exemplo, baseou seu sucesso em um modelo claro: baixo custo, alta moda, conjuntos prontos para usar.
Por fim, uma área essencial: a dos cuidados com o corpo. O setor das dietas e dos produtos para emagrecer movimenta US$ 20 bilhões por ano no mundo. Com o segmento de academias, que responde por US$ 14 bilhões, forma um complexo setor composto por variada oferta de equipes, espaços de treinamento, suplementos nutricionais e alimentos dietéticos, a maioria dirigida ao público feminino.
A Curves, rede norte-americana de academias exclusivas para mulheres, que oferece práticos ciclos de meia hora de treino, descobriu um filão lucrativo: estar em diversos locais para ser a escolha mais conveniente. Hoje, é a maior rede de academias do mundo, com mais de 10 mil unidades em 70 países.
O ranking dos mais odiadosTanto com finanças como com a área de saúde, as mulheres se sentem profundamente descontentes. Algumas empresas tentam satisfazer suas necessidades mais urgentes. Sob o slogan “Os homens não entendem”, o banco United Overseas, em Singapura, oferece cartões de crédito especiais para o público feminino, com serviços completamente diferentes de seus cartões tradicionais.
A fabricante de bebidas funcionais Beveragette Ventures lançou a Keep it Cool sob sua marca GEM, bebida criada para aliviar os sintomas da menopausa. A Johnson & Johnson comercializa de produtos que detectam o câncer de colo de útero, tratamentos para acne, lentes de contato descartáveis e pílulas anticoncepcionais a kits de primeiros socorros e produtos de higiene pessoal.
Basicamente, bens que simplificam a vida das mulheres e em que elas confiam.
De acordo com Maddy Dychtwald, demógrafa especialista em marketing, estilo de vida e tendências de consumo e coautora de Influence: how women’s soaring economic power will transform our world for the better (ed. Voice), os setores que se concentraram nos homens como seu principal alvo –bancário, de serviços financeiros, de tecnologia, automobilístico– costumam crer que, ao pintarem seus produtos de cor-de-rosa, estarão atendendo à demanda feminina. “As empresas inteligentes, por sua vez, cavam fundo para descobrir o que querem as consumidoras e, em consequência, estão reinventando sua empresa de maneira drástica.”
Para produzir seu livro, Dychtwald entrevistou mais de cem mulheres. Uma significativa maioria disse sentir-se incompreendida por executivos de marketing das empresas de serviços financeiros (84%), dos fabricantes de automóveis (74%) e das empresas de saúde (66%). “Muitas organizações ainda pensam nos homens como o protótipo do cliente e nas mulheres como um mercado de nicho. Mas não podem continuar se descuidando do consumidor mais poderoso do planeta”, assinala a autora.
Alberto Pierpaoli, presidente-executivo do Gender Group, firma de consultoria de marketing especializada em diferenças culturais de gênero, aponta que “a publicidade não registra as mulheres. Representa-as como personagens estereotipadas: objetos sexuais, donas de casa, mães, esposas, sempre subordinadas aos homens. Quando as considera independentes e seguras de si, são masculinizadas. Isso se deve a um viés de gênero; os homens mandam na criação de comerciais”.
“Temos de falar”Diferentemente do público masculino, o feminino aprecia a presença de ajuda durante o processo de compra em uma loja. Delia Passi, fundadora da organização de consumidoras WomenCertified, assinala que a mulher demanda mais interação e mais contato visual que o homem. Enquanto ele exige respostas rápidas, ela busca apoio e colaboração.
“Men buy, women shop: the sexes have different priorities when walking down the aisles” [Os homens compram, as mulheres vão às compras: os sexos têm prioridades diferentes quando andam pelos corredores], pesquisa conduzida pela Wharton School, da University of Pennsylvania, e pela firma de consultoria canadense The Verde Group, entrevistou 1.250 compradores norte-americanos e concluiu que “os homens reagem aos aspectos mais utilitários da experiência de compra, como disponibilidade de estacionamento, existência de produtos em estoque e tamanho da fila do caixa, enquanto as mulheres desfrutam a experiência em si mesma”.
Tom Peters sugere aos homens executivos que se mantenham à margem das discussões sobre as experiências de compra de qualquer produto ou serviço que inclua clientes mulheres, a não ser que mais de um terço dos presentes na sala seja do sexo feminino e tenha posição de autoridade. “Os homens não têm mais a menor pista sobre o que as mulheres querem”, conclui.
Quem as entende?
A partir de sua pesquisa mundial sobre os gostos das mulheres, o The Boston Consulting Group segmentou o público feminino em seis arquétipos básicos:
Mulheres que vivem contra o relógio:
São as consumidoras mais sofisticadas e de mais alta renda. Têm agenda apertada. Sentem-se atraídas por produtos e serviços inovadores. Dividem-se em mulheres que lutam pelo reconhecimento (motivadas pelo sucesso profissional) e mulheres independentes (sem filhos, trabalham intensamente, têm alta educação e realizam poucas tarefas domésticas).
Mulheres sob pressão:
São as que mais sentem o estresse da falta de tempo e as responsabilidades. Dividem- -se em mulheres multitarefa de sucesso (profissionais com filhos e no controle de sua vida) e mulheres que lutam pela estabilidade (trabalham, lidam com tarefas domésticas e o tempo nunca é suficiente).
Mulheres que se concentram em relações:
São jovens, têm bom nível educacional e sentem-se mais motivadas para ter uma família feliz do que sucesso profissional. Têm alta renda e dedicam a maior parte do tempo ao marido, aos amigos, a viajar e a se divertir.
Mulheres satisfeitas com filhos independentes:
A maioria tem mais de 50 anos. Seus filhos já não moram com elas. Algumas, ainda casadas, dedicam tempo ao marido. Sua preocupação principal é a saúde e envelhecer com dignidade. Trabalham menos horas e têm tempo disponível para o ócio.
Mulheres sozinhas:
São divorciadas ou viúvas, administram a própria vida. Um bom plano de saúde importa mais do que um novo amor. Vivem menos confortavelmente do que no passado, o que lhes gera mal-estar. Valorizam a autonomia e sua prioridade é o trabalho.
Mulheres que lutam para chegar ao fim do mês:
Vivem estressadas, administram seus gastos no detalhe, são infelizes e não investem tempo nem dinheiro em artigos de beleza ou academias. Carecem de estudos universitários, o que afeta seu nível de renda e contribui para os baixos níveis de satisfação pessoal.
6 maiores barreiras à liderança:
- Falta de metas para participação feminina 3,14
- Falta de modelos exemplares a seguir 3,13
- Falta de políticas adequadas de equilíbrio entre vida pessoal e profissional 3,13
- Falta de soluções de trabalho flexíveis 3,00
- Normas gerais e práticas culturais do país 3,00
- Não compromisso dos líderes com a diversidade 2,71
A escala de notas varia de 1 (menos problemática) a 5 (mais problemática).
Fonte: Revista HSM Management, por Florencia Lafuente