A inovação é atualmente o grande desafio que todas as empresas devem enfrentar, qualquer que seja seu tamanho, e a 3M é um exemplo disso. Prova dessa tendência é o dossiê desta edição. Ou ainda o fato de que, entre 1994 e 1995, cerca de 275 livros publicados nos EUA levavam a palavra inovação no título.
Pois existe uma companhia em que a inovação já se tornou tradição: ela se chama 3M, e, a cada dia, uma dentre quatro pessoas na Terra usa um produto seu.
HSM MANAGEMENT fez uma visita especial à sede da 3M, em Minneapolis, no Estado de Minnesota, EUA, para descobrir como essa empresa fundada em 1902 tem tanta facilidade para inovar e tanto sucesso com isso, mesmo nadando contra a corrente (afinal, possui diversos focos em vez de um e oferece uma quase-estabilidade aos funcionários).
Percorrendo suas instalações, não é difícil entender: todos os funcionários são estimulados a desenvolver soluções inovadoras para os problemas e necessidades dos clientes e chegam a apresentar mensalmente cerca de 150 idéias novas.
Os números dessa empresa são impressionantes.
Em 1996, sua receita foi de US$ 14,2 bilhões – e, em 1997, só a subsidiária do Brasil faturou aproximadamente US$ 500 milhões. O investimento anual em pesquisa e desenvolvimento fica perto de US$ 1 bilhão; são cerca de 74 mil funcionários em todo o mundo, sendo 6.000 pesquisadores; e somam-se quase 70 mil itens, desde letreiros de estradas que refletem com o farol do carro até adesivos Post-it.
As empresas visionárias têm uma característica muito peculiar: nunca se sabe o que será delas, mas sempre é certo que continuarão a existir. Sem dúvida, a Minnesota Mining and Manufacturing Co., ou simplesmente 3M, é uma dessas empresas visionárias. E isso desde seus primórdios, quando, apesar do fracasso inicial na tentativa de explorar um mineral abrasivo chamado coríndon, fez o impossível para não desaparecer. Para manter-se viva, passou vários meses tentando conceber algo que fosse viável. No final, seus fundadores decidiram abandonar a mineração e fabricar lixas. Foi assim que, mais por desespero do que por planejamento estratégico, a 3M deu sua bem-sucedida virada.
Assim, depois de um começo desastroso há quase cem anos, a 3M floresceu, graças a uma linha de produtos imprevisível e sempre em transformação. William McKnight, um dos pilares da 3M, dizia que não se pode ter sucesso “colocando todos os ovos na mesma cesta”. É por isso que, numa época em que se fala tanto em ter um foco claro, o único foco possível para a 3M é a diversidade de focos.
Segundo James Collins e Jerry Porras – autores do livro Feitas para Durar (ed. Rocco) –, empresas visionárias são aquelas líderes nos mercados de que participam, intensamente admiradas por outras grandes empresas e com grande impacto em todo o mundo. Exemplos disso são Motorola, Johnson & Johnson, Hewlett- Packard, Boeing, Merck e, é claro, a 3M. Não importa quantas mudanças administrativas atravessem, ou que um de seus produtos se torne obsoleto, essas empresas estão sempre de pé. Marc Adam, vice-presidente de marketing da 3M, afirma: “Na 3M enfrentamos guerras, depressão, recessão, mudanças sociais e de comportamento, de hábitos e de crenças. Mudamos de pessoal, de CEO. Mas continuamos produzindo os mesmos resultados. Portanto, devemos ter algo diferente. Nossa cultura é muito forte, e não mudamos por meio de revoluções. Muitos dizem que a estratégia é a revolução (veja artigo de Gary Hamel na página 114) e que esta implica destruir para depois voltar a construir. Nós não acreditamos nisso; acreditamos na adaptação permanente, em nos reinventarmos a cada dia”.
Com quase 70 mil produtos, a 3M há muito tempo se orgulha de seus esforços de inovação. “As pessoas custam a entender como estamos organizados. Todos se perguntam qual é nosso foco. Acredito que a diversidade é uma vantagem extraordinária, pois nos dá a possibilidade de oferecer mais de uma solução a mais de um mercado. Tanto é que o tapete da Basílica de São Marcos, em Veneza, é da 3M”, diz Marc Adam. “Nosso enfoque consiste em identificar clientes-chave em cada setor específico e estabelecer uma relação que nos permita entender profundamente suas necessidades. O segredo de nosso negócio, entretanto, é descobrir as necessidades não-explícitas, que já existem, mas não são conhecidas pelos próprios clientes”, acrescenta. Para resolver os problemas desses clientes, a 3M percebeu que era necessário encontrar soluções inovadoras. Notou também que, para isso, precisava ter uma filosofia clara, já que nenhum produto, nem por golpe de sorte, poderia sustentar quase cem anos de lucros. Assim, decidiu fazer da inovação o foco central de sua ideologia – e a ideologia é o componente central de toda e qualquer empresa visionária. Detalhadamente, a ideologia central da 3M é: inovar, “não matar uma nova idéia de produto”, ter integridade absoluta, respeitar a iniciativa individual e o crescimento pessoal, tolerar erros, oferecer qualidade e confiabilidade, e alcançar a solução de problemas.
Quando inovar é tradição
“É como jogar”, diz Robert Finocchiaro, diretor do Centro Óptico, referindo-se à inovação. O jogo, nesse caso, chama-se criatividade, a capacidade de pensar novas idéias. A inovação, por sua vez, é a implementação dessas idéias. Em outras palavras, criatividade é o conceito e inovação, o processo. Evidentemente, nada disso pode ocorrer sem uma organização que respalde o processo.
Não basta que a inovação aconteça no laboratório; ela deve se espalhar por toda a empresa. Mas por que a inovação em primeiro lugar? Na 3M, a resposta é simples: “Queremos crescer, devemos fazê-lo se quisermos sobreviver e, para tanto, precisamos da fidelidade de nossos clientes. Para conquistar sua fidelidade, devemos satisfazer suas necessidades, e a melhor forma de conseguir isso é com produtos e tecnologias inovadoras”, afirma William Coyne, vice-presidente de Pesquisa e Desenvolvimento.
De outra maneira, o CEO e presidente do conselho administrativo da 3M, Livio D. DeSimone, que morou dez anos no Brasil, diz o mesmo: “A inovação é o motor do crescimento”. Esse é o segredo do crescimento porque agrada aos clientes. Em geral, fala-se de satisfação do cliente em termos de entrega just-in-time, assistência técnica etc. Mas o verdadeiro “encanto”, segundo a 3M, está em oferecer aos clientes algo surpreendente, novo e valioso. Algo que seja a resposta a um problema do qual eles se queixam há anos, ou a solução para um problema que nem eles mesmos sabiam encontrar.
Quando isso acontece, os clientes se sentem satisfeitos e tal satisfação é a base da fidelidade para toda a vida. Um passo importante para fazer da inovação uma tradição é saber transmitir sua importância. A inovação deve se converter em parte da imagem da empresa, parte de sua visão. A 3M é muito clara com relação a isso: quer ser a empresa mais inovadora e o fornecedor preferido. E consegue. “Sempre digo a meus funcionários que todo seu esforço deve ser no sentido de tornar essa visão válida. Do contrário, precisam repensar seu trabalho”, afirma Geoffrey Nicholson, vice-presidente de Operações Internacionais. “E a melhor maneira de medir o alcance de nossa visão é ouvir de nossos clientes que somos a empresa mais inovadora do mundo.”
A 3M entende que há no mercado dois tipos de necessidades.
Em primeiro lugar estão aquelas que os clientes reconhecem. Por exemplo, a maior parte das indústrias sabe que é necessário substituir os clorofluorcarbonos (CFC) por outros produtos químicos, por causa dos danos ao meio ambiente. A 3M reconhece essa necessidade explícita e hoje é líder no desenvolvimento de produtos substitutos.
Em segundo lugar, vêm as necessidades que os próprios clientes não sabem que têm – são, evidentemente, as mais difíceis de diagnosticar, exigindo um estudo profundo e preciso das situações a que os clientes estão expostos no dia-a-dia. Mas, segundo os executivos da 3M, são essas que geram os produtos mais úteis e proveitosos.
Ao se descobrir uma necessidade, o inventor tem diante de si um mercado sem concorrência. E, se a necessidade for grande, a recompensa poderá ser imensa. Um bom exemplo é a experiência de Air Fry, o criador do Post-it. Um dia, em 1974, Fry estava cantando no coro da igreja e percebeu que, para achar mais facilmente as músicas programadas, poderia marcar as folhas com pequenos papéis, grudados com um pouco de cola. Depois de muitos testes e erros, a idéia funcionou muito bem, como todos já sabem. O invento de Fry também é um excelente exemplo de como a combinação de tecnologias é crucial para a 3M.
Anos antes da experiência de Fry no coro da igreja, Spencer Silver havia inventado um adesivo semelhante ao Post-it que acabou não servindo para a finalidade a que se destinava e foi esquecido. Ou seja, a 3M muitas vezes chega ao lugar de destino aos tropeções, vivendo de acordo com a filosofia de que só tropeça aquele que está andando.
O pessoal da 3M reconhece a importância de estabelecer metas que realmente gerem esforços e levem a aprimoramentos significativos. “Temos duas metas diretamente relacionadas com inovação. A primeira estabelece que 30% de nossas vendas anuais devem ser provenientes de produtos que estejam no mercado há menos de quatro anos. A segunda – e essa meta é mais recente – determina que 10% das vendas venham de produtos com apenas um ano de vida no mercado”, diz Coyne. Por quê? Porque a empresa acredita que inovar é também a capacidade de ter consciência do tempo, ou seja, saber qual o melhor ritmo a adotar. Para alcançar o melhor em termos de inovação é preciso mover-se rapidamente.
Outro dos objetivos mais importantes da empresa é incentivar todos os projetos, apostando principalmente nos que serão capazes de mudar as bases da concorrência, as regras do jogo. Produtos que redefinam o que os clientes estão esperando, produtos que redefinam o próprio setor. O pessoal da 3M resolveu chamar esses produtos de “pacing plus” (andando mais). Existem, no momento, 25 deles.
São artigos que cada departamento da empresa acredita que poderão gerar uma quantidade imprevisível de outros produtos. Segundo Adam, “são o tipo de produto que nasce de uma idéia e nem nós mesmos sabemos até que ponto vai se expandir. É muito difícil prever que quantidade de outros produtos um pacing plus gerará”.
Andrall E. Pearson, um dos autores de Seeing Differently, afirma, por sua vez, que existem etapas-chave pelas quais uma empresa deve passar para se tornar mais dinâmica e inovadora: criar um ambiente dentro da empresa que incentive constantemente os funcionários a vencer a concorrência em termos de inovação; estruturar a empresa de forma a promover a inovação, em vez de bloqueá- la; elaborar uma estratégia que sirva para canalizar os esforços inovadores; saber buscar novas e boas idéias e descobrir a melhor maneira de implementá-las, uma vez encontradas.
Tudo isso parece muito simples. E é simples, mas não fácil, já que a inovação é um desafio do princípio ao fim, que deve ser enfrentado por todos os empresários, pois é uma ferramenta capaz de criar liderança de mercado. Para Nicholson, que está há 34 anos na 3M, a empresa se caracteriza também pela boa administração de suas operações internacionais. E muitas vezes cabe perguntar como se pode manter uma tradição de inovação tão forte misturando tantas culturas. “Na verdade, a inovação é produzida de maneira constante graças às diversas culturas dos diversos países com que a 3M trabalha. A inovação nunca é fácil, mas podemos torná-la menos difícil, incentivando nosso pessoal das mais variadas formas.” Adam, por sua vez, acredita que a inovação é a principal vantagem competitiva com que a 3M pode contar.
Ele afirma que a função do marketing é diferenciar a empresa da concorrência, tentando agregar um valor que os consumidores não conheçam. Sendo assim, a estratégia da 3M é ser líder de mercado por meio da inovação. Para ser uma empresa inovadora é preciso utilizar toda sua capacidade para melhorar a qualidade de vida das pessoas.
Ser inovador significa ser líder, ser capaz de implementar com êxito uma idéia criativa. Muita gente tem idéias criativas, mas se essas idéias não forem colocadas em prática não haverá inovação. Por isso, outro passo importante para conseguir uma tradição de inovação está em saber contratar pessoas e dar-lhes absoluta liberdade na hora de trabalhar. É necessário contar com pessoas criativas e confiar nelas.
O poder da 3M está no fato de possuir certo grupo de pessoas criativas, que produzem novas idéias, e outro grupo de pessoas capazes de implementá- las. Só assim é possível introduzir cerca de 50 produtos no mercado por mês; ou seja, um produto e meio por dia, em média – um total de quase 500 por ano.
Do jeito de cada um
A diversidade de pensamento é mais importante que o nível de inteligência. As pessoas mais criativas que trabalham na 3M não são necessariamente as mais inteligentes, segundo a própria empresa. “São as que conseguem fazer as associações de idéias mais inusitadas, e essa não é uma função da inteligência: deriva da curiosidade e da capacidade de adquirir mais e mais conhecimentos. Quando não se tem essa capacidade, não se pode ser criativo”, afirma Alex Cirillo, diretor do departamento de Produtos Gráficos Comerciais.
De acordo com Cirillo, para chegar à diversidade de pensamentos “é necessário que os grupos de laboratório sejam formados por diferentes tipos de pessoas. Eles devem contar com as criativas, as detalhistas e as capazes de concretizar um projeto. Ou seja, devem ter os ‘geradores’, que dão início aos projetos, os ‘executores’, que realizam as tarefas necessárias, e os ‘concretizadores’, que os finalizam. Os que concretizam os projetos não são muito bons para começá-los e os geradores não são bons para chegar ao produto final”.
Para promover a iniciativa individual, a 3M tem como regra permitir a todos os pesquisadores gastar livremente 15% de seu tempo. Assim começam todos os projetos que, mais tarde, serão transformados em produtos. Essa parte do processo, quando uma idéia começa a tomar forma, é muito individual, e geralmente está a cargo de uma só pessoa. Há um risco muito grande de fracasso, a gerência não participa, não há planos, nem estrutura, nem disciplina. Tudo é caos. Depois, com o passar do tempo, e com a convicção de que aquela boa idéia poderá vir a ser, um dia, um produto, introduzem-se os diversos grupos e setores. A gerência ordena e organiza o trabalho. Desaparece o caos, disciplina-se o tempo e respeitam-se cronogramas rígidos. Essa etapa final é a dos 85% do tempo. Se na parte dos 15% tudo é livre, sem organizações limitadoras da criatividade, na parte dos 85% aplica-se um sistema de lançamento de produto muito organizado. Para os inventores da 3M, o essencial é ter muita curiosidade e aproveitar os 15% de tempo livre para ver de perto tudo que está no caminho.
Além disso, é fundamental compreender que uma boa idéia é como um bebê: é preciso cuidar dela, protegê-la e alimentá-la para que cresça. Segundo Elmer Blackwell e Casey Carlson, dois inventores da divisão de Adesivos, “para que a criação possa explodir e se desenvolver, não devemos nos preocupar com o que as pessoas possam dizer”. Eles prosseguem: “Para criar é preciso observar até os menores e mais sutis gestos das pessoas. Depois, o que vem é como um jogo: devem-se combinar as coisas, porque a invenção surge das associações de idéias que são feitas. Com relação às pesquisas de mercado, acreditamos que a melhor maneira de entender o que acontece lá fora é perguntar a pessoas sobre suas necessidades – e algumas nem elas próprias conhecem”. De acordo com os dois inventores, portanto, “o melhor é tirar conclusões depois de observar e não obter respostas sobre determinados produtos induzidas por pesquisas de mercado eventualmente malfeitas”.
Esse processo de criação individual fortalece o posicionamento da 3M nos diversos mercados – arte que, aliás, domina: ela busca um nicho pequeno, entra nele, retira o máximo que pode e passa para o seguinte.
O fato de uma empresa ter tradição de inovação pressiona, de certa forma, os funcionários. Existe algo chamado “tensão criativa”, pois é um desafio conseguir que 30% de vendas provenham de produtos medianamente novos. Embora não seja possível prever em que momento uma idéia nova aparecerá, nota-se que, na 3M, ocorre com maior frequência nas sextas-feiras à tarde. Isso se explica pelo fato de as pessoas estarem mais descontraídas e tranquilas, de modo que as idéias fluem mais facilmente. “Deveríamos criar uma semana de sextas-feiras”, sugere Adam.
Ingredientes da inovação
São dois os ingredientes mais importantes para estimular a criatividade: em primeiro lugar, apoiar a mudança e os riscos que ela implica; segundo, ser tolerante com os erros. Quanto à forma de recompensar a inovação, muitos gerentes, especialmente os da 3M, não acreditam na compensação financeira. Na 3M, os funcionários preferem o reconhecimento de seus pares. Para isso, a empresa oferece prêmios como o Golden Step, o Genesis Grants e o Carlton Society.
A comunicação entre os funcionários é essencial para uma empresa que enfatiza a inovação. Por isso, há reuniões intermináveis na 3M, ainda que poucas sejam programadas. Na maioria dos casos, profissionais de diferentes atividades reúnem-se informalmente para falar sobre os problemas que enfrentam. Isso é reforçado pela natureza da organização, que obriga todos a se conhecer algum dia.
Por exemplo, na sede, além de elevadores, há escadas rolantes para que as pessoas se vejam. Somente com uma comunicação plena se pode criar uma tradição de inovação. A gerência na 3M comunica diretamente à cúpula a visão dos laboratórios. Estes devem informar a gerência sobre as oportunidades. E os inventores devem comunicar-se uns com os outros para constatar a eficácia e a influência de suas invenções. Isso é importante porque permite à empresa obter o máximo proveito dos investimentos em novas tecnologias. É também um estímulo para mais inovações.
Na 3M, realmente se acredita que as diversas tecnologias devem ser compartilhadas. A 3M fomenta a noção de que ter esse envolvimento e comprometimento é a condição sine qua non para um bom desenvolvimento de produtos. Essa noção se transmite de tal maneira que os funcionários não apenas se orgulham de trabalhar na empresa e pertencer a ela, mas também sabem que podem lá ficar por toda a vida, embora essa não seja a tendência do mercado de trabalho nos últimos tempos.
No sistema de valores da 3M, os indivíduos são estimulados a conceber formas de fabricar novos produtos, o fracasso é aceito, há uma orientação para uma relação permanente e estreita com o cliente, há um processo bem compreendido por todos que prega o progresso por pequenas etapas, a comunicação intensa e informal é a norma, as instalações das fábricas contam com grande quantidade de locais para experimentos e a ausência de excessivo planejamento e burocracia, bem como a concorrência interna, são evidentes.
Todos esses fatores fazem com que a inovação tenha êxito na 3M. E como, decididamente, inovação gera inovação e a criatividade é contagiante, a quantidade de idéias que surgem é notável. Segundo Geoff Nicholson, essas idéias novas chegam a 150 por mês, o que significa que é preciso examinar cinco idéias por dia e tomar decisões sobre elas. Do total, cerca de dez merecem ser estudadas. Talvez o mais difícil para uma empresa inovadora seja encontrar pessoas que se enquadrem nas expectativas desse tipo de filosofia empresarial. O desafio é contratar pessoas que se caracterizem por ser práticas, curiosas e criativas – e incentivar a criatividade individual. “Trinta ou talvez 20 anos atrás”, diz Nicholson, “nossos funcionários eram, em geral, daqui da área de St. Paul, Minnesota, uma região agrícola. Eram filhos de agricultores, acostumados a manejar tratores e caminhões. Quando essas máquinas paravam de funcionar, toda a vida eles arregaçaram as mangas e se arrumaram com o que tinham à mão. Eram pessoas muito práticas. Mais tarde, na universidade, conseguiam altas qualificações, mas nada mudava sua essência prática. O que ocorre hoje? Basicamente o mesmo: são filhos de agricultores, que também manejam tratores e caminhões. Mas hoje, quando as máquinas deixam de funcionar, a solução é chamar alguém por telefone para consertar. Da mesma forma, quando vão para a universidade, obtêm boas qualificações, mas não são o tipo de pessoa prática com a atitude de arregaçar as mangas e resolver problemas. Na 3M queremos pessoas qualificadas, porém também práticas”.
Nos corredores da 3M ouvem-se várias frases impagáveis, verdadeiros mandamentos empresariais, porém talvez a mais importante para os inventores seja: “Melhor pedir perdão que pedir licença”. Isso demonstra que a liberdade dos funcionários da 3M é total, já que deles depende a reinvenção constante da empresa. Como ela consegue isso? Encontrando necessidades e criando soluções.
O senhor McKnight William McKnight conseguiu, sem dúvida, manter viva a empresa quando, entre 1907 e 1914, ela enfrentava problemas de qualidade. Esse jovem e estudioso contador, que não tinha nem 30 anos ao ocupar o cargo de CEO, conseguiu melhorar os produtos e compreendeu qual deveria ser a filosofia da empresa. Não queria que a evolução e a expansão da 3M dependesse só dele. Sua intenção era criar uma empresa capaz de mudar de forma contínua e autônoma, impulsionada por funcionários que usassem sua iniciativa individual, matéria- prima do processo evolutivo. “Escutar qualquer pessoa que tenha uma idéia original, ainda que pareça absurda; estimular as pessoas para que não se detenham diante de pequenas coisas; contratar pessoas capazes e deixá-las em liberdade; darlhes o espaço de que precisam; fomentar as experiências e a exposição a riscos; fazer ensaios de tudo, rapidamente.” Essas são as frases que esse entusiasmado inovador espalhou por toda a empresa.
Para McKnight, dono de uma curiosidade insaciável e com grande impulso para o progresso, não havia requisitos para a inovação. A única condição que uma idéia tinha de preencher para ser escolhida era ser basicamente nova. Segundo os atuais diretores, o empowerment já era praticado na 3M muito antes de o termo ser cunhado. McKnight já dizia: “À medida que nossa empresa cresce, é de vital importância delegar responsabilidades e motivar os funcionários a exercer sua iniciativa. E isso requer muita tolerância da parte da gerência, pois, na maioria das vezes, é ela que aniquila, com críticas destrutivas, a iniciativa essencial para o crescimento da companhia”. Dar liberdade a todos os empregados é algo fácil de dizer, porém difícil de implementar. É necessário ser tolerante com os erros que ocorram. Estas são as palavras do visionário McKnight: “Queremos institucionalizar um pouco de revolução em nossos laboratórios. Acreditamos na disciplina, mas também consideramos necessário um pouquinho de caos. Incentivamos as pessoas a seguir suas idéias mais loucas”.
O especialista em administração e inovação Tom Peters costuma recomendar que se esqueça um pouco o curriculum vitae na hora de contratar pessoas e se olhe para outros aspectos. Em seu livro Em Busca do UAU, afirma: “Não se obtém caráter de indivíduos sem caráter”. O mesmo raciocínio vale para vitalidade, dinamismo e energia. Para promover essas qualidades, é preciso promover pessoas que as possuem, e é isso que a 3M faz. Peters se refere especificamente aos profissionais da 3M em determinado trecho: “Eles estão tão empenhados na inovação que o ambiente geral não parece o de uma grande organização, mas de uma ampla rede de laboratórios com inventores apaixonados e intrépidos empresários que dão toda a corda à sua imaginação. Estimulam a exposição a riscos e asseguram que todos na empresa cometam um número razoável de erros”.
Como o fracasso é parte da vida, a 3M já espera que ele ocorra. De mil idéias, apenas cem acabam se convertendo em verdadeiros projetos, e uma pequena parte destes chega a se converter em verdadeiros produtos. E quase a metade desses produtos fracassa. Porém, nem todos os fracassos ocorrem nos laboratórios de projeto. Se todos na empresa são convocados a participar do desafio de inovação, os fracassos aparecem em todos os departamentos. Essas coisas acontecem porque a inovação implica, necessariamente, riscos.
A lição mais importante que se pode aprender com as grandes empresas é que a criatividade se paralisa quando há a obrigatoriedade de seguir regras. Em seu livro Vencendo a Crise, Tom Peters e Bob Waterman afirmam que as possibilidades de lucro excelente são maiores para as empresas que permanecem razoavelmente próximas dos negócios que conhecem. Por sorte, a 3M optou exatamente pelo contrário dessa regra. Foi uma dádiva seus fundadores terem decidido que a diversidade é a melhor estratégia. As empresas visionárias chegam, sem dúvida, muito longe. Tão longe – para os que não sabem – que a bota com que Neil Armstrong pisou na Lua em 20 de julho de 1969 era da 3M.
Fonte: Revista HSM Management – A reportagem é de Mercedes Reincke