Esqueça a velha prática do mark-up. Não são os custos somados com uma margem que determinam os preços; é o valor para o cliente que importa. Quem quiser aumentar lucros precisa superar a inexperiência em definir preços provocada por anos de inflação e adotar o pricing estratégico.
Formar preços baseando-se nos custos fixos e variáveis do produto multiplicado por um fator (mark-up) preestabelecido é uma prática bastante tradicional na área de formação de preços. Comenta-se que, no varejo, o mark-up preestabelecido é 2 (ou seja, custo vezes 2), que editoras de livros utilizam o fator 4 e a indústria de móveis o fator 7.
Também trabalhei em uma indústria de produtos químicos que utilizava fator 1,6 em função do alto nível de concorrência. Numa pesquisa informal com executivos de 500 empresas médias e grandes brasileiras, mais de 80% dos participantes admitiram ainda adotá-lo.
Provavelmente a maioria dos outros 20% devia determinar preços imitando a concorrência. Essa ainda é a realidade da gestão de preços na maior parte do mercado brasileiro, completamente em descompasso com as práticas mais avançadas do mundo.
Esse atraso não é de se estranhar. No Brasil, até 1994, ninguém podia falar sobre preços sem pensar em inflação. Preços de produtos e serviços já eram difíceis de lembrar, imagine então compará-los.
Foi o sucesso do Plano Real que possibilitou uma estabilidade econômica e monetária inédita no País, com isso as políticas de preços praticadas por empresas brasileiras passaram a ter importância estratégica dentro das opções de marketing.
Precificar era simplesmente uma decisão tática de repassar o índice de inflação aos preços no fim do mês ou aumentar os preços todos os dias (ou semanas) por uma taxa estimada (ou antecipada) de inflação. E isso simplesmente acabou.
Hoje em dia as decisões sobre preços demandam muito mais atenção. Esse método do mark-up possui algumas vantagens: é simples, até intuitivo, e fácil de ser utilizado. Mas está, irremediavelmente, com os dias contados. Várias empresas deixam de ganhar muito dinheiro utilizando-se dessa fórmula e começam a perceber isso.
A razão é simples: essa metodologia ignora o valor percebido pelo cliente. Utilizar um processo que apenas observa custos internos, partindo do pressuposto de que o cliente deverá pagar um fator acima de seus custos de produção, pode simplesmente levar sua empresa à falência por falta de clientes (caso seus custos sejam muito altos) ou por deixar seus clientes satisfeitos demais com o preço.
Outro problema gerado por esse tipo de determinação de preços é a não diferenciação dos segmentos de clientes que seu produto oferece. Todo e qualquer produto fornece benefícios diferentes para diferentes tipos de cliente.
Vamos ilustrar esse ponto com uma fábrica de baterias para trator. Você acredita que todos os segmentos que compram uma bateria para trator deveriam pagar X reais por uma unidade?
Imagine o preço que um fazendeiro, que só precisa comprar uma bateria cada três anos e está isolado em sua fazenda, estaria disposto a pagar se tivesse que ter uma bateria entregue em 24 horas em sua fazenda no interior de Goiás para não deixar seu trator parado.
Utilize agora o mesmo raciocínio para um fabricante de tratores que compra milhares de baterias todos os meses. Ou quem sabe um revendedor de baterias de trator que tem sede em São Paulo e atende varejistas pelo País afora. Fica evidente que o mesmo produto tem valor percebido muito diferente para cada segmento de clientes.
E qual é o novo enfoque de pricing? É o pricing estratégico, que mudará o foco das empresas: elas deverão se preocupar menos com objetivos de market share ou volume de vendas e sim com a lucratividade de seu negócio.
Segundo esse princípio, as empresas precisam entender melhor seus diferentes segmentos de clientes, praticar preços diferentes para cada um e servi-los bem, além de aprender que existem mercados que não foram feitos para seus produtos ou serviços.
Vale lembrar: com a nova visão, várias práticas do mercado acabarão sendo alteradas, como a grande flexibilidade que a maioria dos departamentos de vendas possui para negociar descontos.
Oito mandamentos
Em um mercado cada vez mais competitivo, com produtos chineses e indianos pressionando custos, consumidores exigindo mais por menos e os baixos níveis de crescimento da economia brasileira, a sobrevivência e o crescimento das empresas dependem cada vez mais de uma estratégia de preços inteligente e sustentável. Definir uma estratégia de preços vencedora baseia-se, em grande parte, no que denomino “os oito mandamentos do pricing estratégico”:
- Tenha uma estratégia de preços.
- Segmente seu mercado.
- Crie uma política de preços justa e transparente.
- Evite as guerras de preços.
- Prepare sua força de vendas para vender valor.
- Utilize também táticas de preços.
- Comunique alterações de preços para seus clientes com antecedência.
- Monitore e controle seus preços proativamente.
Tenha uma estratégia de preços
Já não basta mais a empresa possuir uma estratégia de marketing que detalha lançamentos de produtos e outros planos de ação, mas ignora o aspecto preço. Para simplificar, sua empresa poderá adotar uma estratégia de preços baixos ou de preços premium e tudo o que decidir daí em diante deverá estar alinhado com essa decisão.
Acrescente à estratégia planos de ação e objetivos de preços por linhas de produto, região geográfica, canal de vendas e até por cliente-chave. Há 11 estratégias principais:
- Preços premium
Utilize uma estratégia de preços altos quando sua empresa possui algum aspecto de exclusividade em seus produtos ou serviços. Essa estratégia poderá ser sustentada se sua empresa mantiver alguma vantagem competitiva percebida pelos clientes, que estão dispostos a pagar o valor adicional cobrado. O mercado de luxo pode ser um bom exemplo.
Outro pode ser o mercado da saúde: os melhores hospitais com os melhores corpos clínicos podem cobrar mais dos seguros médicos pelo mesmo serviço oferecido por um hospital de menor porte.
- Preços baixos
O nome já diz tudo. Preços baixos todos os dias. O foco da empresa que decide seguir por esta estratégia está em reduzir seus custos de fabricação ou aquisição, manter um nível de serviço mínimo e pouco ou nenhum investimento em construção de imagem de marca. Redes atacadistas e alguns grandes varejistas são exemplos de empresas que adotam essa estratégia.
- Preços para entrar no mercado (ou ganhar mercado)
Os preços são definidos muitas vezes bem abaixo dos dos concorrentes ou dos produtos que dominam o mercado com a evidente intenção de ganhar participação de mercado ou entrar em um novo mercado com alguma inovação e chamar a atenção dos consumidores pela oferta, reduzindo então os riscos inerentes à compra de uma novidade.
As empresas de telefonia móvel que entraram em um mercado já dominado pelas empresas concessionárias de primeira hora são um bom exemplo do uso dessa estratégia.
- Nata de preços (skimming pricing)
Cobrar preços superiores aos concorrentes por determinado período de tempo (durante um lançamento de um novo produto ou de uma inovação). Preços muito altos atraem mais competidores.
Portanto, como a vantagem não poderá ser sustentada por um longo período, a empresa reduz esse preço periodicamente até um ponto de equilíbrio entre as ofertas do mercado e a curva de demanda dos consumidores.
- Preços psicológicos
Qual a diferença entre pagar R$ 99,99 por uma peça de roupa e pagar R$ 100 pela mesma peça? Financeiramente apenas um centavo (isso quando o lojista conseguir lhe devolver o troco), mas psicologicamente foi comprovado por pesquisas que os consumidores que pagam R$ 99,99 acreditam estar fazendo um negócio mais vantajoso do que se tivessem pago R$ 100.
De fato, se sua empresa utiliza preços cheios vai passar uma imagem de maior qualidade. Por outro lado, usando os 99 centavos poderá transmitir uma mensagem de que está vendendo produtos em promoção.
- Preços para uma linha de produtos
É fundamental a coerência de preços em uma linha de produtos. Consumidores percebem diferença de valor em uma linha de produtos mais facilmente do que comparando produtos concorrentes.
Por exemplo, embalagens de Coca-Cola deveriam ter um preço coerente com o volume de líquido vendido em suas garrafas plásticas. Idealmente, quanto maior o volume comprado, menor o preço por mililitro, mas algumas vezes encontramos preços que não seguem essa regra.
O consumidor mais sensível a preço poderá abrir mão da embalagem que procura para levar o produto com melhor preço por mililitro. (Ainda existem na literatura teorias e fórmulas que suportam a formação de preços para uma linha de produtos que está fora do escopo deste artigo.)
- Preços opcionais
Surgiu na indústria automobilística há muitos anos a palavra opcional e um preço associado a ele. Basicamente a idéia que está por trás de uma subsegmentação de mercado é retirar o máximo possível de cada consumidor.
Por exemplo, dentro do segmento de compradores de Chevrolet Celta, há os que querem ar-condicionado, outros direção hidráulica, ou rodas de liga leve. Cobrando separadamente por opcional, uma empresa poderá maximizar seus lucros na venda de determinado produto. Outro exemplo são as tarifas extras para entregas em 24 horas nos sites de compra.
- Preços de captura
Quando produtos são complementares, é natural que a empresa cobre preços baixos pelo item mais caro que só será adquirido uma vez e retire todo seu lucro dos itens descartáveis que são utilizados exclusivamente no produto vendido por um preço baixo. Os exemplos mais comuns são: lâminas de barbear, toners de impressoras, consoles de videogames, entre outros.
- Preços por pacotes
Quando alguma empresa possui um produto muito consolidado, pode utilizar esta estratégia para ajudar a mover o estoque dos itens de menor giro ou com menor participação do mercado. Em geral a empresa combina dois ou mais produtos em um pacote e oferece um desconto para que o consumidor adquira tudo de uma vez.
Outro bom exemplo são as cadeias de fast-food que oferecem refrigerante, batata-frita e sanduíche por um preço mais em conta do que se comprados separadamente.
- Preços promocionais
Cada vez mais utilizados por redes de varejo. Basicamente é uma oferta sobre o preço normal da mercadoria. Pode ser, por exemplo, 30% de desconto ou compre um e ganhe outro grátis.
- Preços por geografia
No Brasil, em função de custos de frete e diferenças de ICMS cobrados em cada Estado, pode se justificar uma estratégia de preços por geografia. Trata-se de uma maneira de cobrar preços diferentes para um mesmo produto e serviço dependendo da área do país em que o cliente se encontra.
Segmente seu mercado
Cobrar um preço único para todos seus clientes pode parecer simples e funcional. Entretanto, agindo dessa maneira, sua empresa deixa muitos clientes sem condição de comprar seus produtos e outros, que poderiam pagar muito mais pelo que compram, acabam ganhando com o fato de sua empresa cobrar apenas um preço fixo.
Crie segmentos e diferencie suas ofertas para cada um deles. Explore a curva de oferta e demanda ao máximo possível e observe crescer tanto seu lucro como seu volume.
Crie uma política de preços justa e transparente
Preços devem ser apresentados de forma transparente e de uma maneira que seus clientes percebam justiça nas condições oferecidas. Nenhuma estratégia de preços poderá ser sustentada no longo prazo se seus clientes e consumidores não puderem entender o que está sendo cobrado e como.
Alguns alegam que essa atitude municia sua concorrência a copiar facilmente seus preços, mas, ao assumir uma posição de liderança de preços em seu mercado por meio dessa medida, sua empresa poderá influenciar preços de forma positiva e evitar uma guerra de preços.
Evite as guerras de preços
Toda empresa líder em preços precisa evitar o máximo possível que a entrada de um novo competidor ou alguma atitude muito agressiva de outro desencadeiem uma reação em cascata quando todo o mercado terá trazido preços e lucros para níveis impossíveis de ser sustentados. Reaja com inteligência aos movimentos de redução de preços da concorrência com alternativas mais elaboradas do que a simples redução de preços.
A melhor maneira para evitar uma guerra de preços é conseguir que sua empresa mantenha o foco na estratégia escolhida e evite reações maiores do que as necessárias para combater um novo concorrente ou uma promoção muito agressiva da concorrência especialmente se sua empresa possuir uma estratégia de preços premium, e provavelmente também marcas líderes no mercado, com clientes fiéis e que sustentariam boa parte de suas vendas até que a racionalidade voltasse ao mercado.
Ao educar o consumidor de que sua marca pode ser comprada por um preço muito inferior ao que estava estabelecido, o caminho de volta para um valor maior é muito difícil de conseguir.
Se, infelizmente, sua empresa for levada a entrar em uma guerra de preços para defender sua posição de participação no mercado, a recomendação é a seletividade. Não reaja com força total, ou seja, com sua linha de produtos completa em todas as regiões onde atua.
Analise bem em que ponto o concorrente está fazendo o ataque e direcione seus esforços apenas para onde for necessário. As táticas que poderão ser utilizadas nesses casos, incluem: descontos por quantidade, programas de fidelidade, desenvolvimento de marcas de “combate”, utilização de novos canais de vendas, entre outras.
Note que as sugestões anteriores são muito mais elaboradas que uma simples redução de preços. A razão para isso é que quanto mais sofisticada for sua reação, menor impacto você terá em suas marcas premium, e maior será a probabilidade de vitória.
Prepare sua força de vendas para vender valor
Vendedores normalmente são pagos para vender. Muitas vezes as empresas não se importam o que venderam nem por quanto, assumindo erros praticados por vendedores e gerentes de vendas que simplesmente destroem uma política de preços bem-feita para não perder volume ou apenas para fechar o negócio e não deixar nada para a concorrência.
É de extrema importância que sua empresa tenha mecanismos de controle de preços e recompensas por lucratividade para sua equipe comercial. Um bom treinamento em como vender e negociar valor deve ser utilizado para facilitar a missão do vendedor em comunicar valor e não entrar na briga de preços.
Utilize também táticas de preços
Não basta uma definição de um plano estratégico elaborado se faltarem planos de ação que suportem suas estratégias em momentos específicos como a entrada de um novo concorrente. Conhecer e preestabelecer táticas de preço para sustentar seus negócios são de vital importância para o dia-a-dia do negócio.
Comunique alterações de preços para seus clientes com antecedência
Sempre que souber que alguma mudança em seus preços será feita, comunique imediatamente seus clientes sobre seus planos. Pode lhe custar um pouco de volume adicional com o preço antigo no curto prazo, mas certamente conquistará a confiança e um relacionamento de longo prazo, necessários para um crescimento sustentável do negócio.
Monitore e controle seus preços proativamente
Com a facilidade que os sistemas de gestão estão trazendo para o dia-a-dia das empresas, é necessário que sua empresa se municie de informações estratégicas de preços para gerenciar proativamente como a estratégia de preços está sendo implementada no mercado e atuar rapidamente na correção de qualquer desvio do plano.
Experiência mostra efeito da guerra de preços
Várias pesquisas já demonstraram que raramente uma guerra de preços leva uma companhia a fechar as portas, um dos grandes temores do mercado corporativo.
Ou seja, apesar de reduzir a lucratividade do mercado, empresas com produtos desejados pelos consumidores manterão suas atividades independentemente do estrago que a guerra de preços poderá causar em seus balanços. Em outras palavras, vale a pena resistir.
Em uma experiência realizada pelo professor Bob Marks da Australian Graduate School of Management, participantes de uma palestra foram convidados a escolher um número entre zero e cem.
Em seguida deveriam prever o número mais próximo de 2/3 da média dos números escolhidos pelo grupo. É natural imaginar que a média do número escolhido seria em torno de 50 e dois terços de 50 é 33.
Entretanto, o número obtido foi 23. O objetivo da experiência foi demonstrar que todos nós tentamos antecipar o que as outras pessoas estão pensando em fazer. Da mesma forma que os outros tentam antecipar o que nós estamos fazendo. Em um ambiente competitivo, como o de negócios, esse comportamento tende a se acentuar.
Esse simples exercício ilustra os aspectos emocionais que acabam gerando reações superdimensionadas em uma guerra de preços. Apesar de, na maioria dos segmentos produtivos, estarmos percebendo um aumento da competitividade pela redução de custos, entrada de produtos importados, ganhos de produtividade e eficiência e maior nível de exigência do consumidor, isso não significa que as empresas deveriam entrar em guerra de preços com tanta freqüência. O resultado final de qualquer guerra de preços é uma destruição da lucratividade de todo um mercado.
A ascensão dos executivos de pricing
Algumas empresas brasileiras passaram a abrir espaço para executivos especializados em pricing. Já começou a aparecer no Brasil quem exerce função como Gerente de Preços, Analista de Preço e Demanda, Diretor de Preços, entre outros cargos similares.
A tendência de executivos de pricing assumirem mais responsabilidades nas organizações e posições cada vez mais altas nas estruturas organizacionais é comprovada pela pesquisa que a Professional Pricing Society realiza cada dois anos e que foi publicada em dezembro de 2006.
Esse crescimento profissional e a valorização da função têm trazido retorno para as empresas e também um aumento acima da média do mercado na remuneração desses executivos.
De fato, a pesquisa demonstra que gestores seniores (vice-presidentes e diretores) de pricing que até poucos anos atrás representavam apenas 10% do universo dos profissionais dedicados a essa área hoje são 29%.
Da mesma forma, o cargo de gerente que há dois anos representava pouco menos de 40% de todos os profissionais na área já ultrapassa 42%. Ou seja, existe forte tendência nos EUA de colocar mais poder na mão dos executivos especializados em pricing.
Essas empresas certamente estão auferindo os lucros que só uma gestão estratégica de preços pode trazer e os profissionais da área vêm alcançando o sucesso com uma carreira em pricing.
Fonte: Revista HSM, por Frederico Zornig. O consultor e especialista em pricing Frederico Max Zornig é fundador e presidente da Quantiz Informática e Consultoria e é autor de dois livros: Preço Certo, lançado em maio de 2007 pela editora Nobel, e Decidindo o Caminho, que aborda liderança e foi publicado em 2006 pela mesma editora. Graduado em engenharia química pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e com MBA pela University of Illinois, dos Estados Unidos, Zornig foi executivo de várias empresas, entre elas Johnson & Johnson e Souza Cruz.